M!CporCoimbra

2009/06/24

Criação de um partido político

Na sequência de notícias divulgadas pela comunicação social, dá-se conhecimento da criação de um novo partido político identificado como um partido “alegrista”.

Clarifica-se que, em reunião oportunamente realizada pelo MIC( Movimento de Intervenção e Cidadania) e pela tendência “Opinião Socialista”, foi anunciado por Manuel Alegre, entre outras decisões, a rejeição da constituição de um partido político. Esta decisão mereceu o acordo dos presentes à excepção de quem vem, hoje, protagonizar a formação de um novo partido.

Sem pôr em causa a legitimidade dessa iniciativa, socialistas e independentes de Coimbra que se revêem nas posições de Manuel Alegre consideram abusiva a apropriação dos valores emergentes da sua candidatura a Presidente da República , bem a colagem política ao Movimento de Cidadãos que , em momento próprio e com legitimidade estatutária, optou por outro caminho.



O Núcleo do MIC - Coimbra

2009/05/01

Alegre indignado com a Inspecção-Geral da Educação

Redacção/Maria Lopes, TVI24/Público.pt, 30-04-2009

Deputado considera que os interrogatórios aos alunos para tentar apurar quem esteve envolvido num protesto são intoleráveis.


O deputado do PS, Manuel Alegre, classificou esta noite de “ intolerável” o caso dos interrogatórios a alunos de uma escola de Fafe feitos por um inspector da Educação. O objectivo era apurar o eventual envolvimento de professores no protesto que incluiu o arremesso de ovos à ministra Maria de Lurdes Rodrigues, aquando da sua visita à Escola Secundária de Fafe, em Novembro.

Na sua rubrica na TVI24, Palavras Assinadas, Manuel Alegre afirmou-se “estupefacto e indignado” com o caso. Apesar de a Inspecção-Geral de Educação “já ter feito uma nota dizendo que nada de anormal ocorreu”, conta o deputado, “isto não pode ficar assim”. O assunto não pode ser silenciado porque “a escola pública existe neste país democrático para formar cidadãos, não bufos nem denunciantes”.

A ser verdade, o caso “é um atentado à liberdade, ao espírito da escola pública e à constituição”, e demonstra que o dito inspector “enganou-se na profissão”. “Um inspector de Educação não pode agir como um inspector de polícia para incentivar alunos a denunciar professores e outros alunos”, reforça Alegre.

O deputado-poeta aproveita para citar outro poeta e pensador: “Dizia Antero de Quental que mesmo quando nos julgamos muito progressistas, pode emergir dentro de nós um fanático e um inquisidor. Eu espero que este fanático e este inquisidor não reapareçam no Portugal democrático, muito menos na escola pública.”

2009/04/25

O 25 de Abril que celebramos

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Manuel Alegre, 24-04-2009, www.micportugal.org

A revolução do 25 de Abril que celebramos é a revolução democrática, a revolução dos três “dês” do Programa do MFA: democratizar, descolonizar, desenvolver. Nessa perspectiva histórica, a revolução do 25 de Abril não é uma revolução perdida, é uma revolução vitoriosa.

Revolução original: os militares derrubaram um regime e não guardaram o poder para si, devolveram-no às instituições democráticas sufragadas pelo voto popular. É tempo de reconhecer que se trata de um caso único na História, algo de que todos nós, portugueses, devemos ter orgulho.

Revolução pioneira: o 25 de Abril mostrou que era possível passar de uma ditadura para a democracia sem cair numa nova ditadura. Foi a primeira vez que numa situação revolucionária tal aconteceu. E por isso o 25 de Abril português tem uma dimensão internacional, abrindo caminho à transição democrática na Espanha, na Grécia, no Brasil e noutros países da América Latina.

Como disse na altura Salgado Zenha, “o 25 de Abril foi o primeiro de um conjunto de factos que iniciou no mundo uma nova era.” Mais tarde o americano Samuel Huntington escreveria que a revolução portuguesa tinha inaugurado a terceira vaga democrática.

Não sejamos, pois, mesquinhos em relação a nós próprios. Não desvalorizemos uma revolução que, além de nos restituir a liberdade de expressão, mudou a História de Portugal, ajudou a mudar a História da Europa, de África e da América Latina e ainda hoje é estudada pelos países que chegaram recentemente à democracia.

E não deixemos que sejam esquecidas três dimensões fundamentais do 25 de Abril: a dimensão ética, a descentralização e a dimensão da paz.

A dimensão ética, a aspiração à justiça social, foi inscrita por todos os partidos, da esquerda à direita, nos seus programas iniciais. Os direitos sociais, o direito à saúde, à habitação, ao ensino, à cultura, à segurança social, ao trabalho, estão consagrados na nossa Constituição. Pode haver diferentes concepções sobre a forma de os concretizar, mas não se pode esvaziar o seu conteúdo, sob pena de enfraquecer os direitos políticos e a própria democracia.

Realizar a justiça social, consolidar o espírito de serviço público, reforçar os direitos sociais continua a ser um imperativo do 25 de Abril. Não podemos permitir que a vitória dos três “dês” seja ensombrada por outros “dês”, desemprego, desigualdade e desânimo.

A descentralização, através das autonomias regionais e do poder autárquico democrático, é uma das grandes transformações operadas pelo 25 de Abril, renovando a tradição portuguesa das liberdades locais, que um grande açoreano chamado Antero de Quental considerava como um elemento estruturante da liberdade portuguesa no seu todo.

Finalmente a dimensão da paz. O 25 de Abril fez-se contra a guerra. Trouxe a paz a Portugal e reintegrou o nosso país nas instâncias da comunidade internacional. Com o 25 de Abril, Portugal, não sendo embora uma potência económica nem militar, ganhou prestígio político e moral, como país de paz e liberdade, com um papel de ponte entre a Europa, a África e a América Latina.

O 25 de Abril é um daqueles raros dias na vida de um povo em que o futuro está em aberto, indeterminado. Há um passado que se rejeita, mas o percurso a seguir não está definido à partida. É essa abertura inicial que faz com que todos os sonhos sejam possíveis. E é por esses sonhos que devemos continuar a lutar.

Manuel Alegre

2009/03/24

Rádio Moscovo não fala verdade

Mário Crespo, no JN de ontem

O caso de Eduarda Maio surpreende pela crueza. O conteúdo manipulatório do anúncio da subdirectora de Informação da RDP tem uma falta de sofisticação que é irritante. Com total despudor, os principais centros de indústrias de cultura do Estado coligaram-se para dar ressonância à reacção governamental ao protesto.

Sócrates considerou as manifestações de rua politicamente manipuladas. Dias depois do pronunciamento do primeiro-ministro, RTP e RDP, em total sinergia, acrescentam um efeito adicional para potenciar a mensagem do chefe do Governo: manifestações de rua são incómodas e atrasam a vida a quem quer trabalhar. São manifestações "contra" quem "quer chegar a horas", acaba a dizer uma das mais altas responsáveis da informação do Estado em Portugal. Esta afirmação de Eduarda Maio não é feita num comentário a notícias do dia, num editorial ou num espaço de opinião, o que seria trabalho jornalístico legítimo.

A propaganda anti-sindical surge toscamente disfarçada num spot promocional da Antena 1, transmitido pela RTP. Face a isto, é muito difícil ao Governo socialista dizer que não interfere na informação prestada pelo Estado. As dúvidas sobre a postura jornalística de Eduarda Maio depois do seu divertido panegírico "Sócrates o Menino de Oiro" dissipam-se com esta participação na urdidura de marketing político em que se confronta a legitimidade do protesto com o slogan da ditadura que a melhor política é o trabalho

Este último incidente denuncia que a deriva totalitária do regime atingiu em quatro anos um descaramento intolerável para a democracia parlamentar, mesmo desnaturada por uma maioria, que a nossa cultura/incultura política provavelmente não comporta. Assim, usando a legitimidade eleitoral como uma espécie de carta branca para a bizarria, órgãos de Estado desdobram-se em propaganda e repressão que trouxeram a desordem ao sector público e a insegurança ao sector privado. Nesta maneira de estar no poder de José Sócrates, os pseudópodes da criatura maioritária vão cobrindo tudo com um manto de opacidade e intimidação que deforma e perverte.

As reformas conduzidas pelos mesmos chefes do antigamente, sobre quem a bênção socialista terá feito descer o espírito da modernidade, exigem seguidismos amorfos e ameaçam com processos disciplinares e degredo os dissidentes. Este é o Estado como Sócrates o vê em período eleitoral: com aumentos para funcionários quando o resto do país vai para o desemprego e com mordaças disciplinadoras e o quadro de excedentes para os rebeldes. Mas agora que as dúvidas são muitas e a rua já grita, não basta silenciar os números do descontentamento porque eles estão à vista. É a altura do contra-slogan. Tal como a Emissora Oficial no passado, RDP/RTP prestam-se uma vez mais à tarefa de defender regimes à custa de propaganda pensada e executada com o mesmo zelo com que o SNI coordenava, na Emissora Nacional, o programa do salazarismo "Rádio Moscovo não fala verdade". O título deste programa da era de Sócrates é: A CGTP não deixa trabalhar. Como sempre, apresenta-o a Direcção de Informação da RDP.

2009/03/20

Novo anúncio da Antena 1 é ataque ao sindicalismo, diz CGTP

20.03.2009, Maria Lopes, no PÙBLICO

Intersindical apresenta queixa contra spot da rádio pública a criticar manifestações. Carvalho da Silva fala em "atitude de subserviência" ao Governo

A RTP está a emitir um spot publicitário de promoção à informação da rádio Antena 1 que contém críticas negativas sobre as manifestações. O anúncio vai motivar uma queixa formal da CGTP ao Conselho de Opinião da RTP, estando a central sindical a analisar também levar o caso a outras entidades de regulação.
O anúncio de meio minuto mostra carros parados e, num deles, com o rádio ligado na Antena 1, a jornalista Eduarda Maio - uma das principais vozes da rádio pública e autora do livro Sócrates: O Menino de Ouro do PS, a biografia autorizada do primeiro-ministro lançada em 2008 - diz ao condutor que há ali uma manifestação. Quando este lhe pergunta contra quem é o protesto, Maio responde-lhe que é contra ele e "contra quem quer chegar a horas".
"Isto não é apenas uma crítica velada; é um ataque expresso ao sindicalismo", acusa o secretário-geral da CGTP, Manuel Carvalho da Silva, dizendo ainda acreditar que só "por pura coincidência a voz off do anúncio é a da autora do livro de valorização do primeiro-ministro". Eduarda Maio já foi protagonista da anterior campanha da Antena 1, em que se sentava ao lado dos ouvintes para simbolizar a proximidade da estação com o auditório.
Carvalho da Silva lembra que o direito de manifestação é um direito constitucional. "A concepção individualista apresentada no spot não configura a missão de serviço público a que a rádio pública está adstrita, antes parece reflectir uma atitude de subserviência a posições de incómodo manifestadas pelo Governo relativamente à contestação das suas políticas."
Já João Proença, secretário-geral da UGT, ainda não viu o anúncio mas critica os termos empregues: "Nesses termos o anúncio é infeliz e põe em causa um direito fundamental que é o direito de manifestação", disse ao PÚBLICO. Até ontem à noite não fora feita qualquer queixa junto dos provedores da rádio e TV públicas.
Nos últimos dias, CGTP e Governo trocaram recados sobre a manifestação que, na última sexta-feira, juntou 200 mil pessoas em Lisboa contra as políticas económicas e sociais do Governo. O número não impressionou José Sócrates, que lamentou que "manifestantes e dirigentes tivessem enveredado pelo insulto".

2009/03/17

Desculpem, não tenho soluções

Desculpem, não tenho soluções


No JN de Ontem

Ouvir dizer ao mais alto nível do Estado que não há soluções para o horror do desemprego é ouvir dizer que o Estado faliu. Meia centena de trabalhadores despedidos de fábricas em Barcelos e Esposende tiveram essa experiência de anticidadania. Numa visita, o presidente da República foi confrontado com um grupo de desempregados que empunhavam cartazes pedindo ajuda. Foi ter com eles e disse-lhes que não tinha nenhuma solução para os seus problemas.

Para um chefe de Estado é proibido dizer isso aos seus concidadãos e depois embarcar num carro alemão de alto luxo e cilindrada, acenando, apoquentado, aos que nada têm.

É isso que faz querer que os ricos paguem as crises.

Só se é chefe de um Estado para trabalhar na busca de soluções e encontrá-las. Sem isso não se é nada. Ser presidente em Portugal não é um cargo ritual. O presidente tem nas mãos ferramentas poderosas para influenciar o destino do país. Pode nomear e demitir governos, chamar agentes executivos e executores, falar aos deputados sempre que quiser, reunir conselheiros, motivar empresários, admoestar ministros e deve, sobretudo, exigir resultados. Ser chefe de Estado em Portugal inclui poderes executivos, e como tal, ter responsabilidades de executivo. Ao dizer que não tem soluções para as vítimas do descalabro que há três décadas estava em gestação no país onde ocupou os mais elevados cargos, o presidente da República dá à Nação a mensagem de que nem ao mais alto nível há o sentido da responsabilidade nem a cultura de responsabilização.

Ao dizer aos desempregados de Barcelos que nada pode fazer, o presidente diz a todo o Portugal que o Estado e o seu sistema não são mais do que um imenso círculo de actores autodesresponsabilizados que vão passando a batata-quente de uns para os outros. Depois destas declarações aos desempregados, o célebre letreiro "The Buck Stops Here", que Roosevelt tinha na sua secretária, não tem lugar na mesa de trabalho do presidente português. Com esse letreiro, que equivale a dizer que a batata-quente não passa daqui, Roosevelt lançou as bases da maior economia do Mundo das cinzas da grande depressão. Em Portugal, na maior depressão de sempre, o presidente diz que não tem soluções. Devia tê-las. Aníbal Cavaco Silva desde Sá Carneiro que participa no Governo. Dirigiu executivos durante a década em que Portugal teve a oportunidade histórica de ter todo o dinheiro do Mundo para se transformar num país viável. Mesmo com a viabilidade da economia questionada, Cavaco Silva, como profissional que é, regressa à política com uma longa e feroz luta pela presidência da República. Assumiu-se como a "boa moeda" que conseguiria resistir às investidas das "más moedas", na sua cruel pedagogia da Lei de Gresham, que foi determinante para aniquilar um governo do seu próprio partido e dar-lhe a chefia do Estado.

É um homem de acção impiedosa e firme, quando a quer ter.

Se o pronunciamento que fez de não ter soluções para esta crise foi uma tentativa de culpabilizar só o Governo, então foi de um insuportável, mas característico, tacticismo. Se foi sincero, então foi vergado pelo remorso, e anunciou que a sua longa carreira de político e de homem público chegou ao fim.

2009/02/18

Um PS mais à esquerda? Entre o optimismo e o criticismo

Alguns sectores da ala esquerda do PS mostram-se muito optimistas em relação à tentativa do PS de renovar a maioria “reposicionando-se à esquerda”. Veja-se um texto recente de Paulo Pedroso:

«Apesar das grandes diferenças ideológicas entre os partidos, os eleitores circulam entre eles. Muitos já votaram umas vezes no PS, outras no PCP e outras ainda no BE ou nos partidos de que nasceu. Todos o sabem. Mas o PS está a introduzir uma novidade na questão. Dá sinais de tentar renovar a maioria reposicionando-se à esquerda, dando prioridade às classes médias, combatendo as desigualdades, erradicando discriminações persistentes. Essa orientação gerará, evidentemente, dificuldades tácticas ao PCP e ao BE. Não será surpreendente, pois, que radicalizem o seu discurso sobre o PS enquanto não encontrarem novo rumo.» (Banco Corrido, 14/02/09).

É verdade que as pessoas podem votar ora num ora noutro partido, mas é muito duvidoso que as mudanças de sentido de voto se devam principalmente ao discurso pré-eleitoral ou às propostas programáticas de cada congresso. Por outro lado, os “sinais” hoje dados pela direcção do PS inserem-se na sua tentativa de impedir a fuga de parte do seu eleitorado de esquerda. Mas os sinais a que esse sector presta atenção não se confundem nem com o conteúdo da moção de Sócrates nem com o seu mais recente discurso de piscadela de olho.

As bases e o povo em geral têm uma inteligência prática que lhes permite perceber intuitivamente o grau de coerência e de demagogia que envolve as frases bonitas dos líderes políticos. «Faz o que eu te digo não faças o que eu faço», talvez seja uma frase a soar nas cabeças de muitos ex-eleitores do PS.

Por outro lado, quer dentro quer fora do PS há outras vozes e outras inquietações que também revelam a flagrante contradição entre discursos e práticas. As opções de voto resultam mais das lições tiradas do passado recente (a memória é realmente curta...) e porventura das promessas não cumpridas do que das novas promessas (memória curta, mas não tanto...). Sem dúvida que muitos desejariam destruir o chip da memória do eleitorado, mas isso ainda não é possível. Vejamos uma outra leitura mais crítica:

«Paulo Pedroso reconhece a inflexão centrista nesta legislatura, mas pensa que tudo mudará com a moção que o líder vai apresentar ao congresso, sobretudo se for vertida no programa de governo (PÚBLICO, 3/2/09). Outros militantes, como Joaquim Veiguinha (“O congresso de um partido fictício”, PÚBLICO, 31/1/09), são bastante mais cépticos. Será que só porque a moção esboça uma inflexão para a esquerda isso terá efectivamente implicações? É duvidoso. Não estava escrito no programa do partido e do governo, em 2005, que iriam mobilizar os professores para as reformas na educação? Estava. Mas foi a isso que se assistiu? Não. E como compaginar a aposta na educação e nas qualificações, que também estavam nos programas, com o brutal desinvestimento nas universidades públicas? E que dizer da vontade expressa na moção de valorizar o diálogo com os sindicatos, quando, apesar de alguns acordos na concertação social, uma das marcas fortes deste Governo têm sido o ataque aos sindicatos? Ou será que vamos assistir agora a uma inflexão ideológica, porque grande parte da chamada "ala esquerda" está agora com Sócrates? Mas tem estado sempre, no Parlamento e no Governo. E que diferença fez, nomeadamente em termos de votações parlamentares? Pouca ou nenhuma, exceptuando o grupo alegrista.» (André Freire, PÚBLICO, 16/02/09).

Eu, pessoalmente também estou mais do lado dos cépticos. Porém, isso não significa que deva subscrever o discurso radical daqueles que julgam estar a revolução e o fim do capitalismo ao virar da esquina. O país vai ter que ser governado, e prefiro que o seja com base em opções e políticas sociais de esquerda (ou de centro esquerda) do que entregar o poder ao total controlo de quem mais estimulou os factores da actual crise. Mas, o PS da unanimidade que vai reunir-se em breve em Espinho não parece estar em condições de assumir os (muitos) erros desta legislatura. E sem isso, sem um debate aberto e plural dentro do partido, as promessas de mudança não têm credibilidade. Veremos se a discussão aberta a independentes, agora proposta pelo PM – reeditar os Estados Gerais?... – terá condições para deslocar o PS mais para a esquerda...

Elísio Estanque
http://www.boasociedade.blogspot.com/, 17/02/09

2009/02/15

Cordão humano com 1300 pessoas abraça choupal para impedir construção de viaduto

Via rodoviária importante para Coimbra mas local é contestado

15.02.2009 - 14h24 Lusa

Cerca de 1300 pessoas formaram hoje um cordão no Choupal, em Coimbra, num abraço simbólico de defesa da mata nacional e protestando contra a passagem de um viaduto sobre o espaço verde e de lazer.

Organizado pelo movimento cívico Plataforma do Choupal - constituído para impedir a passagem do viaduto na mata, conforme previsto no novo traçado do IC2 -, o cordão humano foi formado a partir das 11h00 por cidadãos anónimos e figuras da cidade, tendo também a participação das deputadas do Bloco de Esquerda e do PS Alda Macedo e Teresa Portugal, respectivamente.

O cordão foi fechado pouco depois das 12h00 em torno de "uma área importante do Choupal" ao som dos aplausos dos participantes, referiu Luís Sousa, do movimento cívico, mostrando satisfação com a adesão à iniciativa e ao avançar com a estimativa das 1300 pessoas.

"Gostávamos de ter mais pessoas, mas estou muito satisfeito. Apelo aos decisores públicos para que tenham o bom senso de travar esta decisão irracional do ponto de vista rodoviário e atentatória para Coimbra", defendeu o arquitecto, em declarações aos jornalistas.

O biólogo Jorge Paiva, o antigo director da Polícia Judiciária Santos Cabral, o director dos Serviços Sociais da Universidade de Coimbra, Luzio Vaz, os deputados municipais do Bloco de Esquerda Catarina Martins e Serafim Duarte, os membros do Movimento de Intervenção e Cidadania Maria do Rosário Gama e Elísio Estanque, o candidato da CDU à Câmara de Coimbra, Francisco Queirós, o presidente da Junta de Freguesia dos Olivais, Francisco Andrade, sindicalistas, professores e advogados, foram alguns dos participantes na acção.

Razões para o viaduto aceites, localização não

"Venho como cidadã, é o Choupal que me traz aqui. Não há bom conimbricense que não queira defender o Choupal. As razões que levaram a esta obra são do consenso geral, a ponte-açude está sobrecarregada. Mas porque há-de ser aqui?", declarou aos jornalistas a deputada socialista eleita por Coimbra Teresa Alegre Portugal.

Segundo a parlamentar, "o governo socialista procurou responder a uma necessidade que lhe foi posta - não quer dizer que tenha encontrado a solução ideal".

A deputada do Bloco de Esquerda Alda Macedo lembrou os dois requerimentos apresentados ao governo pelo seu grupo sobre esta matéria e defendeu que o Choupal "é um espaço privilegiado, que tem de ser defendido e preservado".

"Não deve ser perturbado, porque há alternativas", disse a deputada à agência Lusa, ao enaltecer a "iniciativa cidadã" de hoje. Para o presidente do Conselho da Cidade de Coimbra, José Dias, "não houve uma discussão atempada nem aprofundada" da questão.

"O traçado do IC2 vai matar aquelas árvores e ter um grande impacto ambiental no Choupal. Cresci aqui, os meus filhos praticam desporto aqui", disse à agência Lusa Ana Caldeira, uma bibliotecária de Coimbra que vive no Monte Formoso, em frente à mata nacional, e que se integrou hoje na multidão de crianças e adultos, a pé, de triciclo e de bicicleta, que acorreram à acção organizada pelo movimento cívico.

Esta acção teve por objectivo "impedir que a Mata Nacional do Choupal seja irremediavelmente afectada pela construção de um viaduto rodoviário com 40 metros de largura e que a atravessa numa extensão de 150 metros", segundo uma nota da Plataforma

2009/02/12

Está bem... façamos de conta

Mário Crespo, JN, 10-02-2009

Façamos de conta que nada aconteceu no Freeport. Que não houve invulgaridades no processo de licenciamento e que despachos ministeriais a três dias do fim de um governo são coisa normal. Que não houve tios e primos a falar para sobrinhas e sobrinhos e a referir montantes de milhões (contos, libras, euros?). Façamos de conta que a Universidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo.

Façamos de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês. Façamos de conta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral de que, pelo que sabe, no Freeport está tudo bem e é em termos quid juris irrepreensível. Façamos de conta que aceitamos o mestrado em Gestão com que na mesma entrevista Freitas do Amaral distinguiu o primeiro-ministro e façamos de conta que não é absurdo colocá-lo numa das "melhores posições no Mundo" para enfrentar a crise devido aos prodígios académicos que Freitas do Amaral lhe reconheceu. Façamos de conta que, como o afirma o professor Correia de Campos, tudo isto não passa de uma invenção dos média.

Façamos de conta que o "Magalhães" é a sério e que nunca houve alunos/figurantes contratados para encenar acções de propaganda do Governo sobre a educação. Façamos de conta que a OCDE se pronunciou sobre a educação em Portugal considerando-a do melhor que há no Mundo. Façamos de conta que Jorge Coelho nunca disse que "quem se mete com o PS leva". Façamos de conta que Augusto Santos Silva nunca disse que do que gostava mesmo era de "malhar na Direita" (acho que Klaus Barbie disse o mesmo da Esquerda). Façamos de conta que o director do Sol não declarou que teve pressões e ameaças de represálias económicas se publicasse reportagens sobre o Freeport. Façamos de conta que o ministro da Presidência Pedro Silva Pereira não me telefonou a tentar saber por "onde é que eu ia começar" a entrevista que lhe fiz sobre o Freeport e não me voltou a telefonar pouco antes da entrevista a dizer que queria ser tratado por ministro e sem confianças de natureza pessoal.

Façamos de conta que Edmundo Pedro não está preocupado com a "falta de liberdade". E Manuel Alegre também. Façamos de conta que não é infinitamente ridículo e perverso comparar o Caso Freeport ao Caso Dreyfus. Façamos de conta que não aconteceu nada com o professor Charrua e que não houve indagações da Polícia antes de manifestações legais de professores. Façamos de conta que é normal a sequência de entrevistas do Ministério Público e são normais e de boa prática democrática as declarações do procurador-geral da República. Façamos de conta que não há SIS. Façamos de conta que o presidente da República não chamou o PGR sobre o Freeport e quando disse que isto era assunto de Estado não queria dizer nada disso.

Façamos de conta que esta democracia está a funcionar e votemos. Votemos, já que temos a valsa começada, e o nada há-de acabar-se como todas as coisas. Votemos Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos, Kabila ou o que quer que seja. Votemos por unanimidade porque de facto não interessa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos.


2009/02/08

A Cidade precisa de nós! O Choupal precisa de nós!


Vimos convidar os cidadãos de Coimbra, inscritos no MIC a solidarizarem-se com a defesa da Mata Nacional do Choupal, ameaçada com a construção de um viaduto sobre uma área considerável na zona sul.

Não podemos conformar-nos com esta solução, justamente por ser a única!

Não podemos ser indiferentes ao sacrifício do Choupal aos problemas rodoviários!

Não podemos aceitar que ,por esta via, se vá reabilitar o Choupal!


É preciso mostrar o que é ser Cidadão!

É preciso dizer que somos Contra o viaduto, porque somos Por Coimbra!


Vimos convidá-lo a juntar-se aos 4000 cidadãos que assinaram uma petição a favor do Choupal, como o grande “pulmão verde de Coimbra”, marcando presença no próximo domingo, dia 15, pelas 12h, no Choupal.



Pelo Movimento de Intervenção e Cidadania - M I C


Teresa Portugal

MIC não será partido mas debaterá a reforma do sistema político

Assembleia Geral clarifica missões e objectivos da associação


Lançar o debate sobre o sistema político e defender a mudança da legislação eleitoral no sentido de abrir o Parlamento a candidaturas independentes foi uma das decisões que saiu da Assembleia Geral da MIC, que reuniu em Coimbra, na sede do INATEL. Esta reforma tem sido defendida por Manuel Alegre como uma das formas de abrir o sistema político à cidadania e à renovação. A questão de vir a transformar o MIC num partido foi totalmente arredada, à luz dos estatutos e da natureza do MIC, que é uma associação cívica para fomentar a democracia participativa e a cidadania, como Manuel Alegre clarificou junto dos jornalistas.
A crise política que se vive em Portugal e o papel do MIC foi um dos temas de debate na Assembleia Geral. Apesar da diversidade de opiniões, houve duas linhas de força consensuais: com o agravamento da situação económica e social, 2009 vai ser um ano particularmente difícil que exige de todos um esforço adicional de participação e acção cívica. Mais do que nunca exige-se que o MIC se alargue e seja actuante à escala local e nacional. Nesse sentido foi aprovada uma alteração estatutária que prevê uma Comissão Executiva de 3 pessoas, integradas na direcção nacional do MIC e que poderão, em sintonia com Manuel Alegre, introduzir uma nova e mais pronta capacidade de resposta do movimento. O outro tema que emergiu do debate foi a clarificação dos objectivos e natureza do MIC, uma associação que enquanto tal não se confunde com os partidos nem tem objectivos eleitorais, mas pode e deve contribuir para que sejam resolvidos os grandes défices da sociedade portuguesa, desde o défice de Justiça aos défices social e cívico.
Esta clarificação foi acentuada por Manuel Alegre, que afirmou aos jornalistas que o MIC “nunca poderia ser um partido porque isto é uma associação cívica. Tem como objectivos fomentar a democracia participativa e a cidadania. De acordo com os seus estatutos nunca poderia tornar-se um partido político”.

2009/02/06

Manuel Alegre acusa Santos Silva de fazer "discurso estalinista"

06.02.2009, no Público, Leonete Botelho
Ministro dos Assuntos Parlamentares classificou de "minudências" alertas para falta de debate interno e diz que a prioridade é "malhar" na oposição
Caiu mal no PS a forma como o ministro dos Assuntos Parlamentares reagiu às acusações de falta de debate interno, ouvidas num debate no Largo do Rato, em Lisboa, sobre as moções ao congresso. Augusto Santos Silva classificou as críticas como "minudências" e recusou exercícios de "autoflagelação". "Eu cá gosto é de malhar na direita e gosto de malhar com especial prazer nesses sujeitos e sujeitas que se situam de facto à direita do PS. São das forças mais conservadoras e reaccionárias que eu conheço e que gostam de se dizer de esquerda plebeia ou chique". "Um discurso estalinista", considerou Manuel Alegre.
Quarta-feira à noite, na sede do partido, o debate contrastou com o tom habitual das reuniões da comissão política e os autores das moções rivais às de Sócrates quiseram discutir a situação interna do partido. Entre eles o histórico Edmundo Pedro, apoiante de Fonseca Ferreira, que, depois de ouvir Santos Silva, afirmou haver no PS quem não se pronuncie por medo. "Verifiquei um total desinteresse, generalizado, notei outro fenómeno de pessoas que estão no aparelho de Estado que me diziam 'não posso pronunciar-me, porque tenho medo'; não é admissível no partido", disse o fundador do partido.
Solidário com Edmundo Pedro, Alegre deixou ontem bem claras as diferenças que vê entre os dois protagonistas da noite anterior: "Se alguém sabe o que é o medo e a luta contra o medo é o Edmundo Pedro". "Sem os seus combates, não só contra o fascismo mas também pela consolidação da democracia, se calhar não havia nem PS nem democracia e o dr. Santos Silva não seria ministro num regime democrático", considerou ao PÚBLICO.
Para Alegre, o medo que existe agora "não é da polícia, mas de discursos como esse": "Pessoas que não gostam do debate dentro do PS, que se discutam as questões internas e que quando se discutem se diz que está a fazer o jogo da oposição. É o discurso estalinista por excelência".
Outros históricos socialistas também se demarcaram, com mais ou menos intensidade, do tom usado por Santos Silva. "Uma figura de estilo que não subscrevo completamente", referiu Vera Jardim, deixando claro, no entanto, que "é natural que em ano de eleições o partido que está no poder se concentre" na oposição. "O meu camarada Edmundo Pedro é um herói da resistência à ditadura e merece a maior admiração de todos os portugueses pelo seu passado, pelo seu presente, por aquilo que é", afirmou Alberto Martins, líder parlamentar do PS, sublinhando assim quem é, em seu entender, a referência do PS.
Já Paulo Pedroso preferiu criticar Edmundo Pedro: "A expressão medo é completamente descabida". "Há menos debate do que eu gostaria, mas medo não vejo nenhuma razão para ter", considerou. Sobre as declarações de Augusto Santos Silva, o ex-ministro do Trabalho prefere acentuar a dimensão pragmática: "As prioridades para 2009 são as eleições. Ele tem razão quanto à tendência do PS de, às vezes, sobrevalorizar as pequenas questões internas às grandes questões do país".
Medo ou calculismo, certo é que são comuns os pedidos de deputados para não falar sobre assuntos internos ao telefone e os olhares sobre o ombro para ver quem possa estar perto a ouvir conversas com jornalistas.

2009/02/02

Convocatória do Conselho de Fundadores do MIC


Convoco o Conselho de Fundadores do MIC, ao abrigo da alínea a) do número 3 do artigo 25 dos Estatutos, para o próximo dia 7 de Fevereiro, sábado, em Coimbra, às 14h30, no Auditório do INATEL, Rua Dr. António Granjo nº 6, com a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto único - Apreciação da proposta de alteração de Estatutos do MIC apresentada pela Comissão Coordenadora

O Presidente do Conselho de Fundadores

Manuel Alegre
30.01.09

2009/02/01

Esquerda tem de agir em tempos de crise, defende Alegre

Inauguração da sede do Movimento de Intervenção e Cidadania da Região do Porto

[Raquel de Melo Pereira , TSF, 01-02-2009]

Manuel Alegre defendeu, este sábado, durante a cerimónia de inauguração da sede do Movimento de Intervenção e Cidadania da Região do Porto, que, numa época de crise, as forças de esquerda têm de agir e lançou também um apelo à cidadania.

É preciso saber se «vamos permitir que os investimentos» preservem «os interesses dos poderosos ou se vamos seguir critérios rigorosos de investimentos públicos» na educação, nos serviços públicos e no combate ao desemprego, questionou, frisando que é importante perceber se o país vai permitir o «agravamento das desigualdades».

Quanto aos investimentos públicos, o deputado socialista sublinhou a necessidade de defender os serviços de saúde e da educação, além da cultura e da língua.

«Não pode haver esta dualidade de milhões e milhões de euros para preservar bancos que administram grandes fortunas e um milhão de euros para a promoção» do português, afirmou Alegre, recebendo aplausos.

O socialista defendeu ainda a necessidade de um debate politico sério para redefinir o papel do Estado, onde os cidadãos devem ter um «papel insubstituível».

Convocatória da Assembleia Geral do MIC

Convoca-se a Assembleia-geral do MIC no próximo dia 07 de Fevereiro, sábado, em Coimbra, às 15h30, no Auditório do INATEL, Rua Dr. António Granjo nº 6, com a seguinte ordem de trabalhos:


1 – Alteração dos Estatutos
2 – Relatórios e Contas de 2006, 2007, 2008
3 – Orçamento e Plano de Actividades de 2009


Se à hora da convocatória não se reunir quórum, a Assembleia reunirá passado 30 minutos com os membros que estiverem presentes.



O Presidente da Mesa da Assembleia Geral

José de Faria e Costa

Coimbra 30 de Janeiro de 2009

2009/01/24

José Sócrates e Manuel Alegre trocam declarações de desagrado

24.01.2009, Público, Leonete Botelho

O primeiro-ministro não gostou de ver deputados socialistas a votar uma espécie de moção de censura. O político-poeta responde na mesma moeda

A tensão entre Manuel Alegre e José Sócrates voltou ontem a subir a um ponto perto da ruptura depois da votação do projecto de lei do CDS-PP que previa a suspensão do processo de avaliação dos professores, uma reforma considerada central pelo Governo PS. Ao primeiro-ministro desagradou ver cinco deputados socialistas a votar ao lado do partido mais à direita do Parlamento e disse-o com todas as letras: "Não gostei." O ex-candidato presidencial, rosto dos socialistas desalinhados, respondeu-lhe à letra: "Também não gosto da política do Governo, nomeadamente na educação", afirmou ao PÚBLICO.
Esta troca de declarações de desagrado soa a fim de tréguas entre Sócrates e Alegre, depois de mais de um mês de conversas e negociações sobre o futuro do deputado num cenário de renovação de maioria socialista. Desde o Fórum das Esquerdas de Dezembro, têm sido vários os contactos directos e indirectos entre os dois, embora Alegre tenha dito, neste período, que a "porta é estreita" para o diálogo entre ambos. Ontem, estreitou-se um pouco mais.
A votação tinha terminado há pouco - com a maioria socialista de 121 deputados reduzida a 116, apenas mais três que os votos a favor - e já Sócrates, em Chaves, acusava a oposição de "oportunismo" e criticava os deputados socialistas que se lhe juntaram. "Vejo muita gente do PS a achar que não devemos fazer alianças com o CDS, mas vi agora alguns elementos do PS a votar com o CDS, e não gostei", afirmou. Uma alusão às declarações de Vera Jardim, antigo apoiante de Alegre, que defende que o PS não deve fazer alianças com o partido liderado por Paulo Portas.
PS canta vitória
Sócrates centrou, no entanto, as críticas nos partidos da oposição. "Acho lamentável que a única instituição neste país que, durante meses a fio, quer avaliar os professores seja o Governo. O que eu lamento é ver tanto oportunismo de todos os partidos que votam as moções uns dos outros, muitas vezes sem conhecerem as propostas, e com um único objectivo, o de se oporem ao Governo", afirmou.
O primeiro-ministro seguia a linha argumentativa que Augusto Santos Silva desenvolveu durante toda a semana e na qual insistiu ontem, durante e após o debate em plenário. Antes da votação, o ministro dos Assuntos Parlamentares fez ainda uma antevisão da "derrota" do CDS e a "vitória da agenda reformista do Governo". "Será a vitória dos deputados livres que não se deixaram chantagear nem intimidar, daqueles que não estão na câmara corporativa a defender interesses profissionais, mas a defender os interesses do povo português", afirmou, merecendo um forte aplauso da bancada socialista. Ao mesmo tempo, alguns deputados do PSD protestaram e apontaram para a última fila, onde se encontravam Alegre e as quatro deputadas que iriam votar a favor.
As palavras do ministro suscitaram reacções de todas as bancadas da oposição. "Não seja chantagista, não seja ameaçador. Estamos a votar este projecto porque não estamos numa câmara corporativa, estamos numa câmara livre", respondeu o líder da bancada do CDS, Diogo Feio. Cecília Honório, do BE, acusou Santos Silva de vir ao Parlamento "fazer chantagem sobre os deputados", enquanto Pedro Duarte, do PSD, considerou que a intervenção do ministro foi uma "espécie de comício interno".
Manuel Alegre também não gostou das palavras de Santos Silva. "Não lhe reconheço qualquer autoridade moral ou política para me dizer o que devo ou não fazer", afirmou ao PÚBLICO.
No final, "saiu vitorioso o grupo parlamentar socialista que se impôs a uma proposta que era uma autêntica moção de censura", afirmou o líder da bancada do PS e outro antigo apoiante de Manuel Alegre, Alberto Martins. Questionado sobre se o Governo se poderia demitir caso o projecto tivesse sido aprovado, Augusto Santos Silva recorreu à antiguidade clássica para responder: "A interpretação de sinais como forma de fazer política terminou com o fim Império Romano. Agora não temos de abrir nenhumas aves para saber de que lado estão os deuses quando tomamos decisões políticas."
Já antes, durante o debate, Ana Paula Barros havia recorrido a elementos da tragédia grega para colorir os argumentos do PS, ao acusar o CDS de "oferecer cicuta numa taça de refrescante champanhe". Ironia ou não, cicuta foi o veneno que matou Sócrates, o filósofo, condenado à morte pelos democratas atenienses.

Suspensão da avaliação dos professores

Alegre avisa que não responde perante Santos Silva nem perante nenhum ministro
[PMF, Lusa, 23-01-2009]

Manuel Alegre criticou hoje o discurso do ministro Augusto Santos Silva sobre liberdade e responsabilidade, avisando que não responde perante nenhum membro do Governo, mas atacou também a pressão exercida por alguns professores em relação aos deputados.

As declarações do deputado socialista à agência Lusa foram proferidas após a votação do projecto do CDS-PP para a suspensão da avaliação dos professores, que foi reprovado pela maioria do PS, apesar de ter contado com o apoio da oposição e de mais cinco deputados socialistas.

Manuel Alegre, Teresa Portugal, Matilde Sousa Franco, Júlia Caré e Eugénia Alho foram os cinco deputados do PS que votaram a favor do projecto do CDS-PP.

"Votei a favor da dignidade da escola pública.

Considero que a defesa da dignidade da escola pública implica a alteração do actual modelo de avaliação", justificou o vice-presidente da Assembleia da República.

No entanto, segundo Alegre, durante o período que antecedeu a discussão do diploma, bem como durante o próprio debate, houve dois episódios que lhe "desagradaram" pessoalmente.

"Houve um tipo de pressão feito por alguns professores sobre os deputados e que demonstram que eles estão mal informados sobre o que se passa na Assembleia da República. E demonstra-se que eles estão mal informados porque até mandaram e-mails a deputados que têm votado a favor [das propostas da oposição para a suspensão da avaliação]", apontou o ex-candidato presidencial.

Para Manuel Alegre, este tipo de pressão "não prestigia a causa dos professores", com a qual o ex-candidato presidencial disse ser "solidário".

Mas, nas declarações à agência Lusa, o deputado socialista criticou também a intervenção feita hoje em plenário pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva.

Durante o debate, o ministro dos Assuntos Parlamentares considerou que o chumbo do projecto do CDS-PP representaria "a vitória dos deputados livres que não se deixam chantagear, daqueles que não estão na câmara corporativa a defender interesses profissionais" e que "estão na Assembleia da República a defender os interesses dos portugueses".

"Desagradaram-me os termos da intervenção do ministro dos Assuntos Parlamentares, porque ser deputado é realmente uma questão de liberdade e de responsabilidade, mas não nos termos em que ele [Augusto Santos Silva] se referiu à liberdade e responsabilidade. Quero aqui dizer que eu não respondo perante ele [Augusto Santos Silva], nem perante nenhum ministro", frisou.

2009/01/22

Alegre contraria sentido de voto do PS e apoia propostas do PCP e BE


[Lusa/SIC, 22-01-2009]

O deputado do PS Manuel Alegre votou hoje, mais uma vez, ao lado do PCP e do Bloco de Esquerda o Código do Trabalho, contrariando o sentido de voto da maioria socialista. O partido do Governo alterou o período experimental de 180 para 90 dias.

"Votei pelas mesmas razões que votei da primeira vez. Não há nada a acrescentar", limitou-se a dizer o ex-candidato presidencial, depois da votação, no Parlamento, de uma alteração ao artigo da lei "chumbado" pelo Tribunal Constitucional.

O PS aprovou hoje no Parlamento o novo Código de Trabalho, com os votos contra de cinco dos seus deputados, depois de ter alterado o prazo de 180 dias do período experimental, que tinha sido considerado inconstitucional, para 90 dias.

Os deputados da bancada socialista Manuel Alegre, Matilde Sousa Franco, Eugénia Alho, Júlia Caré e Teresa Portugal voltaram a chumbar a nova legislação laboral, colocando-se ao lado do PCP, BE e Verdes. O PSD e CDS abstiveram-se.

Manuel Alegre também votou ao lado do PCP e do BE a favor da alteração do artigo 3º, de forma a repor o princípio do tratamento mais favorável.

Na votação, a 19 de Setembro, do Código do Trabalho, Manuel Alegre justificou o seu voto contra a revisão das leis laborais, alegando que a proposta do Governo contrariou as posições do PS de 2003 contra o código do ex-ministro conservador Bagão Félix.

2009/01/14

Novo partido?

Elísio Estanque,

blog " boasociedade.blogspot.com",Terça-feira, Janeiro 13, 2009


A esquerda alegrista

É necessário assumir a necessidade de uma renovação do pensamento e da prática política da esquerda. É necessário uma esquerda para o século XXI, fundada num novo paradigma. Muitos acreditam até que este já está em germinação e que passa, entre outras coisas, pelas iniciativas em torno da figura de Manuel Alegre (MA) e da corrente de opinião socialista por ele dinamizada.

Muita gente tem vindo a pressionar e até a “exigir” de MA que crie um novo partido. A comunicação social anda agitadíssima em torno dessa ideia. Provavelmente se tal iniciativa se viesse a consumar, e sobretudo se isso fosse feito de uma forma precipitada, daria jeito a muito boa gente do actual leque político-partidário.

Concordo que o movimento criado pela candidatura presidencial de MA – pelo seu contributo inovador, pelo discurso aglutinador de diferentes sensibilidades, pelo exemplo de exercício de cidadania e em especial pelo impacto político que já teve – deu início a um novo ciclo, a uma nova forma de conceber a política, os partidos e os movimentos. Acredito que a importância desta experiência pode vir a ser marcante (já está a sê-lo) da vida pública e da política portuguesa nos próximos tempos. Mas estou convencido que a sua importância será tanto maior quanto mais os seus protagonistas sejam capazes de fazer a diferença.

O que implica não haver precipitações em criar uma força eleitoral que poderia causar muitos estragos mas não servir para mais do que isso. Poderia até desaparecer logo a seguir, à semelhança do ex-PRD. Um novo partido, a surgir, tem de partir de uma confluência muito ampla de vontades, inclusive por parte de sectores e forças que já estão no terreno. Implica, como disse MA uma série de rupturas prévias com os próprios dogmatismos e ortodoxias em que potenciais intervenientes estão ainda enredados. O movimento, para se manter coerente em relação às expectativas que criou, tem de dar o exemplo – no discurso e na prática –, mostrar que se guia por valores éticos ao serviço do interesse público e de uma política limpa.

A criação de um partido promovido pelo alegrismo é uma possibilidade, mas a meu ver não no curto prazo, não no imediato. A não ser que novos e inesperados acontecimentos o justifiquem. Um partido pode nascer diferente, mas rapidamente se tornar igual aos outros, imitando-lhe os mesmos vícios e perversões. E se o que se pretende é contribuir para novas políticas e para novas formas de exercer “a política”, há que ter algum cuidado. Há que pensar não apenas no “acto” de criar, mas no processo e na forma de sustentar um tal projecto.

Por outro lado, quer surja algo de novo quer não, a atitude deste movimento e da sua principal figura está sob permanente vigilância e escrutínio público. Ficar quieto e calado poderia passar para a opinião pública a ideia de se estar a fazer algum frete a alguém. Seria o mesmo que dizer amén ao que antes se criticou abertamente (levantando-se a suspeita de alguma negociação de bastidores). Portanto, o movimento e a COS devem continuar a assumir-se como corrente crítica na defesa do socialismo democrático e de uma esquerda renovada e plural, dentro e fora do PS, estimulando o pensamento progressista e preservando a sua autonomia em total liberdade

2009/01/13

Alegre diz que a porta para acordo com Sócrates "é estreita"

Reunião da Opção Soclialista
O deputado socialista Manuel Alegre afirmou hoje que atravessa um momento "difícil" e "pesado", que a porta do diálogo com José Sócrates "é estreita" mas recusou ser "aventureiro", lembrando que também teve quota na maioria absoluta do PS.

As declarações do deputado socialista e ex-candidato presidencial foram proferidas antes de uma reunião com 24 coordenadores da corrente "Opinião Socialista", que tem como objectivo debater o futuro deste movimento político.

Nas declarações que fez aos jornalistas, o ex-candidato presidencial disse que o actual momento político, para si e para o seu movimento, "é difícil e pesado", tendo citado a este propósito uma opinião dada pelo jornalista Ricardo Costa (da SIC), durante a entrevista com o primeiro-ministro, José Sócrates.

"Ricardo Costa, que é um grande jornalista, referiu que o resultado das eleições depende daquilo que fizer", apontou.

Interrogado se sentirá responsável pela perda da maioria absoluta do PS, caso forme um novo partido, Manuel Alegre usou o humor para responder.

"Qualquer dia dizem que sou responsável pelo atentado de Serajevo", que deu origem à I Guerra Mundial, disse.
Nas declarações que fez aos jornalistas, Manuel Alegre foi insistentemente interrogado se vai criar um novo partido político.

"Eu nunca disse que ia fazer um partido. Também nunca disse que não o fazia. Isso é um direito meu. Não é objecto desta reunião saber se vamos ou não fazer um partido", declarou.

O ex-candidato presidencial sublinhou depois que "um partido não se decreta".

"Sou uma pessoa responsável. Não sou um aventureiro político. Defendo o diálogo à esquerda também com o PS. É difícil, é uma porta estreita, quer para o meu camarada José Sócrates, quer para mim próprio.

Interrogado se aceita fazer parte das listas de deputados do PS nas próximas eleições legislativas, o vice-presidente da Assembleia da República disse não querer dar respostas definitivas, "porque isso é muito perigoso em política".

"É difícil que seja [candidato], a menos que determinadas coisas aconteçam, mas é muito difícil".
Sobre o facto de o líder do PS, José Sócrates, contar com ele nas listas de candidatos a deputados, Alegre respondeu que "isso é natural".

"Ele sabe que existe esta realidade de facto: uma corrente de opinião que abarca muitos socialistas. Não aqueles que estão nos órgãos [do partido] mas muitos eleitores socialistas. Abarca também não socialistas.

Não é por mim [que Sócrates convida] mas naturalmente por aquilo que eleitoralmente posso representar", sustentou.

A seguir, Alegre referiu-se às últimas eleições legislativas de 2005.

"Como se viu nas eleições da última maioria absoluta, se calhar eu dei a minha contribuição, participando ao lado dele [José Sócrates] na campanha", declarou.
Em relação ao próximo congresso do PS, Alegre excluiu a hipótese de se apresentar como alternativa.

"Já disse que não participava em congressos. Já lá fui em 2004. Já dei o que tinha a dar para isso", respondeu.

No final da reunião, Manuel Alegre revelou que o movimento que lidera tomou hoje decisões sobre qual será a sua relação com o PS, tendo em vista as próximas eleições, estando disponível para discutir princípios e não "mercearia" de lugares.

"Foram tomadas decisões que brevemente serão tornadas públicas", declarou Manuel Alegre, no final de uma reunião da corrente Opinião Socialista, que juntou cerca de duas dezenas de elementos que o acompanharam nas candidaturas à liderança do PS, em 2004, e nas presidenciais de 2006.

Sem revelar o que foi discutido no encontro, Alegre adiantou apenas que essas decisões dizem respeito "à relação com o PS, tendo em vista as próximas eleições legislativas".

Segundo o vice-presidente da Assembleia da República, o seu movimento está "disposto a discutir" com a direcção do PS "princípios e valores", assim como "propostas programáticas concretas". "Comigo não há mercearia. A nossa disputa não é por cargos ou por lugares", sublinhou.

Independentemente do desfecho das discussões com a liderança do PS, Alegre garante que a corrente que lidera "vai continuar" e pretende mesmo "reforçar-se"."Estamos unidos há muito tempo não só politicamente. Há também uma grande afectividade entre nós", sublinhou.

2009/01/05

Obama

Não estamos habituados a isto.
Ainda bem que posso ser surpreendida ...


2008/12/29

Obama - As palavras inspiram

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Manuel Alegre, revista " Domingo", Correio da Manhã, 28/12/08

Eu vinha no Vera Cruz, de regresso de Angola, em Novembro de 1963, quando, em pleno mar, chegou a notícia do assassinato do Presidente Kennedy. Pertenço a essa geração: a que foi contemporânea da morte de John Fitzgerald Kennedy, e uns tempos depois, de seu irmão Robert, então candidato à presidência, um e outro odiados pelos segregacionistas. A geração que teve como referência a história de Rosa Parks, a senhora negra que se recusou a ceder lugar a um branco num autocarro em Montgomery. Foi o inicio dum grande movimento contra a segregação, liderado, entre outros, por Martin Luther King Júnior, cujo discurso, “Eu tenho um Sonho”, se tornaria uma das inspirações das nossas vidas e um marco na luta pelos direitos civis. Em 4 de Abril de 1968 Luther King seria assassinado num hotel em Memphis.

No exílio, em Argel, conheci Eldridge Kleawer, um dos líderes do Black Power. E também Carmichael, que após mais uma das suas múltiplas prisões, diria, em 1966: “Há seis anos que gritamos liberdade. Agora vamos começar a dizer Poder Negro”. Nos Jogos Olímpicos de 1968, no México, na cerimónia do pódio dos 200 metros os atletas John Carlos e Tommy Smith, enquanto a bandeira americana subia no mastro, baixaram a cabeça e ergueram os punhos, protestando contra a descriminação racial no seu país. Seriam desclassificados, mas o gesto ficou como um símbolo.
Sim, eu vi, eu pertenço a essa geração e nunca pensei que o sonho de Martin Luther King pudesse tornar-se realidade 40 anos depois, quando um Afro-Americano chamado Barak Obama começou a mudar a América com uma simples frase “ Yes, we can”. Por isso, no dia da sua eleição, apeteceu-me dizer: todos somos americanos. Precisamente o que Jean-Marie Colombani tinha escrito no seu famoso editorial publicado no jornal francês, Le Monde logo após o atentado contra as Torres Gémeas em Nova Iorque. Sublinhou ele então que o massacre de inocentes, causado pela loucura, mesmo com o pretexto do desespero, nunca é uma força que possa regenerar o Mundo. Todos sabemos o que se seguiu e como foi desbaratado, pela Administração Bush, o gigantesco capital de boa-vontade que havia na maior parte do Mundo para com o povo americano.

A insensatez, o desespero, a violência e sobretudo a mentira viraram-se contra a própria América. As armas de destruição maciça que não existiam – e que serviram para justificar uma guerra ilegal e inútil, que causou a morte de centenas de milhares de iraquianos –, a tortura em Abu Ghraib, Guantanamo e nas prisões secretas de “países amigos”, provocaram sérios danos na imagem da América. Ao mesmo tempo que estes princípios fundamentais eram sacrificados – em nome de uma segurança e vitórias militares de sustentabilidade duvidosa a longo prazo –, sobejava a crença, quase religiosa, na infalibilidade dos mercados financeiros.
Também aqui os resultados estão à vista. A grave crise financeira e económica e financeira que vivemos tem o seu epicentro nos EUA e na falta de regulação, que deixou à solta a ganância de banqueiros e prestigiadas instituições financeiras. Todos estamos a pagar essa factura e, em Portugal, infelizmente não fugimos à regra: socializar as perdas e manter os lucros privados.

A vitória de Barack Obama beneficiou, em boa medida, do caminho aberto pela campanha de Howard Dean (candidato democrata derrotado nas primárias das eleições anteriores). Refiro-me à vaga de esperança em torno dessa candidatura e sobretudo aos moldes em que foi conduzida a campanha: o empenho de um grande número de jovens voluntários e de pessoas que se haviam afastado da política e dos partidos, o recurso à nova arma da Internet, tanto na disseminação da mensagem como, sobretudo, na angariação de fundos.
Alguns dos ensinamentos da candidatura de Dean foram aplicados na minha própria campanha presidencial. A generosidade dos voluntários, o recurso à internet, aos blogues, aos sms, ajudaram a suprir as carências financeiras e a ausência de qualquer máquina partidária.

A eleição de Obama é a vitória da América sobre si mesma. Significa que o sonho americano está tão vivo e tão forte que é capaz de derrotar um dos mais fundos preconceitos que ainda hoje afecta as nossas sociedades: o racismo. A vitalidade da democracia americana é uma lição que nos interpela. Também entre nós há racismo. Também entre nós as minorias imigrantes estão longe de ser politicamente representados.

Possivelmente Obama não teria ganho sem a crise que se vive na América. A verdade é que os níveis de desigualdade social criados pelas receitas neo-liberais não eram sustentáveis. Basta dizer que as diferenças de rendimento nos EUA voltaram a ser comparáveis ao período que antecedeu a Grande Depressão. Porém hoje vivemos num mundo globalizado, em que os EUA ocupam uma posição dominante, e daí a exportação, à escala global, desse modelo de injustiça e desigualdade.

Para responder a esta crise torna-se necessário buscar inspiração no exemplo daquele que foi porventura o maior dos presidentes dos EUA: Franklin Delano Roosevelt. As suas respostas políticas (fiscalidade redistributiva, reforço dos sindicatos, elevação do nível geral dos salários, intervenção do Estado em sectores-chave da economia, como as obras públicas) voltam a ser da maior actualidade, e apontam o caminho para a construção de uma sociedade em que haja porventura menos bilionários, mas certamente mais prosperidade partilhada e coesão social.

Os profissionais do cinismo apressaram-se a levantar dúvidas sobre a possibilidade de Obama estar à altura das expectativas. Uma coisa é certa: a sua vitória constituiu, em si mesma, uma gigantesca mudança cultural e cívica. Não é por acaso que em todas as línguas se procura agora uma expressão equivalente àquela que fez renascer a esperança: “Yes, we can”. E também não foi por acaso que Obama respondeu a quem o acusava de ser apenas retórico: “As palavras inspiram”.

Manuel Alegre

2008/12/26

Em defesa do público nos serviços públicos

Mesa do painel "Economia" do Fórum de 14 de Dezembro divulga resultados: "Estes debates foram o primeiro passo"

Jorge Bateira, José Castro Caldas, Alexandre Azevedo Pinto, José Reis e João Rodrigues,
economistas e André Freire, politólogo / Público, 24.12.2008

Participámos no painel sobre economia do encontro Democracia e Serviços Públicos. O debate tornou claro que o pluralismo das esquerdas não tem de ser sinónimo de falta de diálogo e de cooperação. Este encontro demonstra que há muita gente (nos partidos de esquerda e independentes) que entende que a excepção portuguesa da incomunicabilidade e da ausência de cooperação entre as esquerdas não é um problema insuperável. As convergências fazem-se com
diálogo aberto sobre os pontos de concórdia e discórdia.
Entre as esquerdas, o pluralismo é positivo e enriquecedor, desde que sem sectarismos.
Mais: muitos como nós pensam que a resposta política para boa parte dos problemas com que hoje o nosso país está confrontado passa por entendimentos entre as diferentes correntes da esquerda.
No âmago da divisão entre esquerda e direita está a valorização da igualdade das condições e oportunidades de vida. Isto não significa que todas as direitas sejam necessariamente inigualitárias. Mas há uma direita para quem a única igualdade seria a igualdade perante a lei que, rejeitando a acção política para promover a igualização das condições e oportunidades de vida, prefere confiar fundamentalmente no mercado. As esquerdas, pelo contrário, olham para o Estado como um instrumento crucial da promoção da igualização das condições e das oportunidades de vida.
Não se trata de defender o predomínio do Estado sobre os indivíduos. Do que se trata é de defender um papel fundamental para o Estado na área dos serviços públicos (saúde, educação e segurança social) e também em sectores estratégicos da economia, nomeadamente nos chamados "monopólios naturais".
Não se trata apenas de melhor servir o desiderato da igualdade. O que está em causa é também um modelo de desenvolvimento: o investimento privado é uma componente central da economia, devendo ser fortemente apoiado nos sectores que produzem bens e serviços transaccionáveis, não apoiado nos sectores protegidos da concorrência internacional e indesejável nos serviços públicos e nos monopólios naturais.
No processo de privatização da provisão de serviços públicos, o Estado transforma-se no que já foi designado de "Estado Predador" - uma coligação de interesses económicos rentistas que prosperam no quadro de um regime de acumulação baseado na expropriação dos recursos públicos.
O caso português é ilustrativo. Na sequência do processo de privatizações (re)constituíram-se em Portugal grupos económicos que se caracterizam precisamente pelo acantonamento na produção de bens não transaccionáveis e pela penetração crescente na esfera da provisão de serviços públicos.
As consequências de tudo isto estão à vista nos países onde o processo foi levado mais longe: fractura social entre os que têm acesso (à saúde, ao ensino e à protecção face aos riscos de desemprego) e os que não têm. Onde o processo ainda vai a meio é patente o aumento do custo e a degradação da qualidade dos serviços (anteriormente) públicos.
Em Portugal, que de há décadas a esta parte continua a situar-se entre os campeões das desigualdades na distribuição de rendimentos em toda a UE e onde os salários continuam tão baixos que um terço dos beneficiários do "rendimento social de inserção" trabalha, a qualidade e a universalidade dos serviços públicos está também sob pressão.
Contrariando uma certa imagem construída pelos seus adversários, de que as esquerdas
socialistas seriam um movimento "bota-abaixista" desprovido de propostas exequíveis, o debate permitiu identificar acordos em torno de algumas linhas de política:

O reconhecimento da centralidade do papel do Estado

Esta centralidade não deve ser confundida com o papel que o Estado actualmente desempenha na socialização das perdas do sector financeiro. A designação "Estado estratega" foi já utilizada para caracterizar o que agora, em contexto de crise, mais do que nunca é necessário: um Estado que em nome do interesse público reassume o controlo de sectores estratégicos, se responsabiliza pela provisão de serviços públicos e pela gestão do território, e utiliza os meios de que dispõe para incentivar e enquadrar o investimento privado.

Valorização do serviço público

Em desacordo com as teorias e as práticas da "nova gestão pública", que tão influente se tornou entre nós dando origem a mais conflitos do que reformas, subscrevemos o que um de nós afirmou: "O nosso país não está condenado a escolher entre serviços decadentes e burocratizados, de um lado, e a erosão do Estado conduzida segundo a ideologia gestionária da modernização, do outro."
Existem formas de modernizar a administração pública que, não reduzindo os servidores do Estado à condição de oportunistas e egoístas, podem nutrir os valores e os significados característicos da ética de serviço público. Os funcionários podem e devem ser mobilizados para garantir o sucesso de quaisquer reformas.

Combate à desigualdade pela valorização do trabalho

A direita procura reduzir o combate à desigualdade à provisão de mínimos de subsistência para os que não podem trabalhar, ou a uma redistribuição do rendimento compensatória. O caso português é ilustrativo das limitações das políticas sociais meramente reparadoras. Para a direita, a determinação do valor do trabalho deveria ser deixada ao mercado. Em alternativa, entendemos ser necessário promover a desmercadorização do trabalho através de regras que protejam os trabalhadores, combatam a precariedade e garantam salários dignos. O desemprego deixou já de ser o principal mecanismo gerador de pobreza, o próprio sistema produtivo voltou a produzir, a par de mercadorias, trabalhadores pobres.
Queremos acreditar que estes debates foram o primeiro passo de um processo que dê aos portugueses razões para enfrentarem o futuro com mais confiança.

2008/12/24

BOAS FESTAS


O pior dos males do nosso tempo é a ausência de esperança, viver "privado de futuro", como escreveu o jornalista francês Jean Daniel a propósito da revolta dos jovens gregos.

Aproveitemos esta época de Natal para reflectir sobre os difíceis caminhos da reconstrução da esperança.

Boas Festas, Bom Ano, um abraço para todos.

Manuel Alegre

2008/12/20

Uma nova esquerda?

Um passo em frente, dois passos atrás

Elísio Estanque, 19/12/08, em www.boasociedade.blogspot.com

Nos últimos dois dias continuaram a suceder-se as entrevistas, os artigos, os comentários directa ou indirectamente relacionados com o Encontro das Esquerdas e Manuel Alegre. Para uns sim, para outros não, para outros nem pensar, enfim... Confesso que todo o frenesim mediático à volta deste acontecimento ultrapassou as minhas expectativas. E esse mesmo facto é em si próprio revelador de que a iniciativa foi boa, foi oportuna, foi no momento certo. Pelo menos foi-o no sentido em que tornou esse evento num novo facto político. Desde logo porque o tem sido ao longo de toda a semana mediática, segundo porque pairou em diversos momentos sobre as iniciativas do Governo e dos partidos políticos (sobretudo os de esquerda) e, terceiro, porque é muito provável que no futuro próximo sejam desencadeadas novas iniciativas que resultam, pelo menos em parte, da do passado fim de semana.

Mais importante do que fazer cálculos eleitorais sobre o modo como o futuro “bolo” eleitoral da esquerda seja repartido (Rui Tavares), ou mais importante do que especular sobre os meios financeiros e o “para quê?” de um novo partido (VPV), será acompanharmos a evolução das coisas. Manuel Alegre foi ambíguo, é certo. Mas, como ele próprio está farto de dizer “a política não é uma questão de preto e branco”, insere-se num campo de múltiplas complexidades (sociais, simbólicas, discursivas, culturais), e é, em larga medida, um jogo. Um jogo em que os actores participantes fazem cálculos e definem estratégicas, mas em que esses mesmos cálculos e estratégias sofrem constantes arranjos e ajustamentos. Muitas vezes a dinâmica das sucessivas “jogadas” ganha vida própria e sobrepõe-se aos actores; seja obrigando-os a fazer aquilo que não pensavam fazer, seja a negar aquilo que antes afirmaram ou prometeram.

Neste caso, o importante é abrir canais e pôr as esquerdas a dialogar e a reflectir. Começa a perceber-se que é falsa a inevitabilidade de termos que viver com os partidos que temos, e de nos resignarmos à sua incapacidade de mudar. O próprio facto desta questão ter assumido as proporções que assumiu na ultima semana dá que pensar. Não será que o terreno está mesmo preparado para uma ruptura de paradigma? E parece cada vez mais claro que o facto político da semana poderá trazer mais novidades para a cena política portuguesa. Mesmo sabendo que a estratégia política já não é o que era, vale a pena lembrar o velho lema de Lenine «um passo em frente, dois passos atrás». Nem tudo será linear, mas há coisas que estão a mudar.

2008/12/17

Protestos na Grécia


Movimentos juvenis e conflitualidade

Elísio Estanque, Jornal Público, 17/12/2008

Os recentes distúrbios na Grécia ou os que ocorreram há poucos anos em França, envolvendo milhares de jovens em fúria, podem suscitar a dúvida quanto à possibilidade de uma onda semelhante de agitação social vir a atingir o nosso país.

Apesar da ideia dos “brandos costumes” permanecer colada à imagem de Portugal, não é preciso recuar muito na nossa história para se constatar que a suposta resignação dos portugueses, tem os seus limites. A I República e o 25 de Abril de 1974 deixaram as suas marcas no plano da contestação e do radicalismo político. Muito embora o actual contexto seja bem diferente dos desses períodos, a realidade social e económica é sempre um factor decisivo para a eclosão de protestos sociais, independentemente das causas próximas – um excesso, um abuso, ou uma morte inocente –, as quais constituem apenas a faísca que pode incendiar a pradaria.

Os movimentos sociais dos anos 60-70 surgiram na sequencia de um conjunto de rupturas socioculturais contra a mentalidade convencional, o clima de Guerra Fria, a corrida aos armamentos, as agressões ao ambiente, a segregação sexual, etc., denunciando as insuficiências da democracia representativa. Tudo isto nos países avançados do ocidente, onde uma economia em crescimento e um Estado-providência forte pareciam garantir um futuro de bem-estar geral. Esses movimentos, animados principalmente por sectores juvenis e escolarizados, filhos das classes médias e superiores, orientavam-se por atitudes e subjectividades pós-materialistas, uma vez que as necessidades materiais estavam asseguradas e eram (ou pareciam ser) irreversíveis.

Ontem, como hoje, uma parte do que anima os movimentos juvenis, como o Maio de 68 em Paris, deriva das condições de emergência que mobilizam os grupos e as comunidades, o que requer a identificação de um opositor, de um “inimigo”. Mas enquanto nessa altura era a consciência política e as auto-proclamadas “vanguardas” que assumiam a liderança da luta, neste início do século XXI a acção colectiva perdeu parte do seu conteúdo político. Dito de outro modo, continua em vigor o princípio da “válvula de escape”, mas os seus efeitos são politicamente mais incertos. As ondas de protesto e o discurso de indignação que as acompanha, exacerbados por um poder de Estado de cariz autoritário, podem ganhar um efeito mimético de proporções imprevisíveis, se para tal as condições sociais se tornarem propícias.

Ninguém pode prever qual o grau de contágio que o caso grego pode adquirir no resto da Europa. Mas o certo é que a juventude europeia se debate com uma absoluta falta de perspectivas de futuro. Tal imprevisibilidade e em especial as perspectivas sombrias no plano do emprego, vêm condenando os jovens licenciados a trabalhos descompensados e mal pagos (a geração dos 500 ou 700 euros), a uma precariedade que se prolonga muito para lá do tolerável. Isto é, sem dúvida, um cenário social bem longe da situação que se vivia nos idos anos 60 do século XX. Hoje, ao contrário daquela década, os problemas e carências materiais (leia-se, ausência de um emprego decente) voltaram a ser a primeira das necessidades por satisfazer. Nesse aspecto, como em vários outros, a Europa regrediu. Hoje, o movimento estudantil já não exprime um radicalismo de classe média, tornou-se antes expressão do descontentamento de milhares de famílias de escassos recursos, que investiram nos seus filhos para lhes dar uma educação (e um “título” de Dr), mas que agora se encontram no limbo entre a precariedade e o desemprego.

Apesar de a juventude actual se mostrar relativamente indiferente perante a política e a “esfera pública”, o consumismo alienante já deixou de ser suficiente para compensar a “privação relativa” com que se confrontam milhares de jovens. Na verdade, a ausência de perspectivas de um futuro condigno (pelo menos tão bom como o dos pais) parece estar a induzir um “ressentimento geracional” que, à falta de medidas adequadas, será propício a respostas radicais e a uma agitação social envolvendo não só os sectores escolarizados com trabalho precário ou em busca do primeiro emprego mas, porventura atrás deles, outros segmentos sociais igualmente empurrados para as margens da sociedade

2008/12/15

A coragem de mudar


Intervenção de Manuel Alegre na Aula Magna no Encerramento do Fórum "Democracia e Serviços Públicos"

Saúdo os meus colegas nesta sessão de encerramento.
Saúdo os oradores e moderadores dos debates que hoje se realizaram.
É possível debater ideias sem dogmas, sem sectarismos e sem demagogia. Isso só não é possível para quem não pratica a democracia.

Amigos, companheiros e camaradas:

Dante reservou os lugares mais quentes do Inferno para aqueles que em tempo de crise moral se mantivessem neutros. Suponho que há neste momento muitos lugares reservados. Para os neutros e para os cúmplices. E sobretudo para os que andaram a apregoar as delícias da mão invisível e da auto-regulação do mercado e agora recorrem à intervenção do Estado para socializar as perdas e preservar os seus bancos, as suas fortunas e os seus privilégios.
Este é de facto um tempo de crise, um tempo em que não se pode ser neutro. Tempo de decisão e coragem.
A coragem de Roosevelt quando, após a Grande Depressão, enfrentou os muito ricos com um política de fiscalidade redistributiva, com o reforço do papel dos sindicatos, com a elevação do nível geral dos salários, com a intervenção do Estado em sectores-chave da economia e com o estabelecimento de direitos sociais, como o serviço público de saúde. Que nomes não nos chamariam em Portugal se hoje disséssemos o mesmo.
A coragem do Governo da Frente Popular presidida por Léon Blum, quando, em 1936, tomou um conjunto de medidas fundadoras dos modernos direitos sociais. Entre eles as férias pagas e as imagens para sempre inapagáveis dos operários que partiam a cantar, de bicicleta ou de comboio, para pela primeira vez verem o mar e gozarem as praias que até então eram só de alguns.
Coragem para mudar a sociedade e a vida. Coragem para estar ao lado dos desempregados e desfavorecidos e não para, à custa dos dinheiros públicos, salvar um banco privado que administra grandes fortunas. Coragem para mudar. A começar por nós mesmos. Coragem para se saber de que lado se está do ponto de vista das lutas sociais. Coragem para dialogar onde até agora se monologava. Coragem para convergir onde até agora se divergia.
Esta não é uma iniciativa inter-partidária. E por isso não está nenhum partido a menos nem nenhum partido a mais. Estão aqui cidadãs e cidadãos que não querem ser neutros e pretendem, em conjunto, procurar novas respostas, convencidos de que é possível construir soluções alternativas e de que é esse o papel da esquerda: não se conformar, não se resignar, não desistir.
Muitos de nós combatemos, por caminhos diferentes, o pensamento único que nos últimos vinte e tal anos desregulou o mundo aplicando em toda a parte as mesmas receitas: diminuição do papel do Estado, redução dos serviços públicos ou a sua gestão em concorrência com os privados, esvaziamento dos direitos sociais, deslocalização, desemprego, exclusão, precariedade, corrupção, destruição do ambiente, agravamento das desigualdades, empobrecimento progressivo da qualidade da democracia.
Começou com Reagan e Thatcher, culminou com Bush e da pior maneira: com a guerra do Iraque, os voos da CIA e Guantánamo, símbolo tenebroso do desrespeito pelos Direitos do Homem de cuja proclamação se celebram agora 60 anos. E por isso é que a eleição de Barack Obama, que é, em si mesma, um factor de mudança cultural e cívica, constitui uma tão grande e porventura desmedida esperança.
Ao longo de todo este tempo, desde a queda do muro de Berlim, o capitalismo ficou sem concorrência, mesmo que para muitos de nós ela não fosse a mais desejável. E ficou também sem a resistência da social-democracia. Agiu como se tudo lhe fosse permitido. Algumas das conquistas sociais que vinham de 1936 e do pós-guerra foram sistematicamente desmanteladas ou reduzidas ao mínimo. Por outro lado, a globalização também globalizou as desigualdades. O resultado está à vista: colapso do sistema financeiro, recessão económica, uma democracia mais pobre, consequências sociais imprevisíveis. Está a acontecer na Grécia, amanhã pode ser em Espanha, pode ser na França, pode ser aqui. Em toda a parte.
Não é possível resignarmo-nos ao nível de desigualdades existente no nosso país. Segundo os índices da OCDE, somos um dos três países daquela organização onde há maiores desigualdades. E somos o país da União Europeia onde há mais desigualdade na distribuição da riqueza. Há qualquer coisa de errado no nosso modelo de desenvolvimento.
Há qualquer coisa que não bate certo num país em que cerca de 18% de portugueses vivem no limiar da pobreza e uma minoria de gestores se auto-atribui milhões e milhões em prémios, indemnizações e salários.
Há qualquer coisa de indecoroso na promiscuidade entre o exercício de cargos políticos e os negócios privados.
Há qualquer coisa do avesso quando o novo Código do Trabalho é elogiado pelo Presidente da CIP.
Há algo de obstinado e cego e surdo quando se insiste numa avaliação por quotas, administrativa e economicista, que está a paralisar a escola pública e a desqualificar a Administração Pública em geral.


Os debates que hoje se realizaram sobre “Democracia e Serviços Públicos” permitiram por certo estabelecer pontes e convergências para a construção de políticas alternativas. Não são um ponto de chegada, mas um ponto de partida. E seria interessante que cada um desses painéis pudesse continuar autonomamente a aprofundar o debate e encontrar novas soluções. Em torno destes temas é com certeza possível encontrar convergências.
Permitam-me agora algumas reflexões e propostas sobre a Democracia e os Serviços Públicos.
O conceito de serviços públicos como actividades de interesse geral que o Estado se obriga a prestar a todos os cidadãos surgiu no século passado. Foi então assumido que se tratava de necessidades colectivas que não podiam ser resolvidas pelo mercado.
A obsessão desreguladora dos anos oitenta pôs em causa este conceito e forçou a abertura ao mercado e à concorrência de sectores até então considerados “Serviços públicos”, como as grandes indústrias de redes (energia, telecomunicações, transportes ou serviços postais). Esses serviços passaram a designar-se como serviços de interesse económico geral.
O processo continuou em áreas essenciais ao cumprimento dos direitos sociais (educação, saúde, segurança social), com a entrada em força do mercado nessas áreas e a criação da figura das parcerias publico-privadas para substituir o que até então fora considerado serviço público.
Assistiu-se ao endeusamento do mercado e à diabolização do Estado, mesmo quando os níveis de satisfação desceram, o desemprego aumentou e os custos dispararam. E à sombra das parcerias publico-privadas floresceram grandes negócios privados e desvirtuaram-se regras de transparência obrigatórias no serviço público.
No direito comunitário, o coração do debate sobre os serviços públicos está no artigo 86 do Tratado Europeu, segundo o qual as empresas que prestam serviços de interesse económico geral estão sujeitas às regras da concorrência.
É preciso questionar e eliminar esta situação. A submissão dos serviços públicos às regras da concorrência priva o Estado de intervir em áreas essenciais para a satisfação das necessidades básicas dos cidadãos e distorce a avaliação dos serviços prestados.
É inaceitável que os serviços públicos sejam tratados como se fossem uma qualquer mercadoria.
É inaceitável que se defenda a perda de milhares de empregos no sector público como condição de progresso.
É inaceitável que se instituam regras de avaliação na educação cujo objectivo é “emagrecer” o número de professores na escola pública.
É inaceitável o encerramento de serviços públicos no interior do país, que contribui, às vezes por forma dramática, para a desertificação do território.
É inaceitável a entrega sistemática ao privado de sectores económicos rentáveis, nomeadamente na área da energia.

A saída da actual crise financeira, económica e social exige que a esquerda apresente políticas alternativas ao modelo neo-liberal e especulativo ainda dominante. Políticas que se baseiem na solidariedade, na sustentabilidade e na cooperação.
Defendo por isso como prioridades:
• o abandono da agenda da “flexisegurança” por uma agenda do “bom emprego”. Isto implica que não se pode abdicar de promover o pleno emprego, com reconhecimento dos direitos dos trabalhadores, incluindo a protecção na saúde e a conciliação do tempo de trabalho com a vida privada e familiar
• o combate à especulação financeira e o reforço dos poderes reguladores e intreventores do Estado
• o investimento público em sectores produtivos e geradores de bem estar social, desenvolvimento e emprego sustentável
• uma distribuição mais equitativa do rendimento e da riqueza como condição do desenvolvimento, através da garantia de salários e pensões mínimas mais elevados e da taxação fiscal de salários e pensões milionárias
• a promoção de políticas contra a pobreza, nas áreas da formação, emprego, habitação, acção social e direitos dos imigrantes
• o reconhecimento do direito à água como um direito humano
• a defesa e reforço da escola pública, do serviço nacional de saúde e da segurança social pública, como garantia de direitos fundamentais dos cidadãos
• a definição de políticas públicas para as cidades, que incluam o transporte, a habitação, o património, a cultura, o ambiente, o espaço público e a participação cívica
• a defesa da qualidade de vida e o combate à especulação imobiliária
• o incentivo a práticas de protecção do ambiente e de eficiência energética

Por todas estas razões, a esquerda tem de promover e aprofundar o debate sobre os serviços públicos e o seu papel numa democracia moderna e de qualidade.

Amigos, companheiros e camaradas

Uma crise como a que o mundo está a viver é também uma oportunidade de mudança. Uma oportunidade que a esquerda não deveria desperdiçar. Ninguém nos perdoaria. Uma oportunidade para propormos soluções de mudança e uma oportunidade para nós próprios também mudarmos. E neste sentido talvez o caminho seja mais árduo e mais complexo.


Não se trata de fazer revoluções já feitas e passadas.
Não se trata de reescrever a história que já está escrita.
Não se trata de inventar novos dogmas, novos sectarismos e novas excomunhões.
Ninguém é proprietário da esquerda, ninguém tem o monopólio da verdade, ninguém é dono do futuro.
A nossa força está na nossa pluralidade, nas nossas diferenças e, no respeito por elas, na nossa capacidade de construir convergências.
É esse o novo e grande desafio moral e político.
É essa a coragem de que precisamos. A coragem de não nos repetirmos. A coragem de abrir novos caminhos.
Não estamos aqui para tentar impedir que outros cresçam, mas para que toda a esquerda possa crescer em todos os sentidos. Não apenas eleitoralmente. Mas cívica e politicamente.
Porque esse é que é o problema. Crescer para quê? Para que políticas? Com que rumo? E para onde?
É preciso que parte da força eleitoral da esquerda não se vire contra si mesma. E muito menos contra as outras esquerdas. Porque essa tem sido a fragilidade das esquerdas europeias e da esquerda portuguesa. Há, por um lado, a esquerda do governo, que quando o é deixa de ser praticante. E a outra, que frequentemente se acantona no contra-poder.
Talvez aqui as convergências sejam mais difíceis de construir. Mas eu estou aqui para falar com clareza, com verdade e com fraternidade. Em meu entender, esse é o novo tabu que é preciso quebrar. A reconfiguração da esquerda implica a capacidade e a vontade de construir uma perspectiva alternativa de poder. Esta é a nova coragem que é preciso ter. Não só a coragem de resistir e persistir, de que muitos de nós temos experiência, mas a coragem de virar a página e construir uma nova esperança e uma nova alternativa.
Sei que não é fácil e não há agendas escondidas. Sei que é algo que não se decreta. Sei que é um processo que, para ser viável, exige consistência e passa pela difícil construção de uma via nova e de uma base programática sólida.

Mas estou de acordo com o que recentemente escreveu Rui Tavares: “Essa é a responsabilidade histórica da esquerda portuguesa. Mas não sabemos se ela vai estar à altura dessa responsabilidade.” Eu acho que precisamos de ter a coragem de estar à altura. Até porque, como diz o mesmo autor, “se o desejo da esquerda é transformar a sociedade portuguesa, o momento aí está.”

Permitam-me também que vos diga, com toda a franqueza e fraternidade, que a reconfiguração da esquerda portuguesa não se fará sem o concurso de eleitores, simpatizantes e militantes do Partido Socialista.
Permitam-me que daqui saúde os meus camaradas socialistas desempregados ou em trabalho precário. Os meus camaradas socialistas que se sentem inseguros com a crise e ameaçados por novas falências. Os meus camaradas socialistas professores que com muitos outros lutam pela suspensão de uma avaliação absurda. Os meus camaradas socialistas funcionários públicos que, apesar de todos os bloqueios, continuam honradamente a servir o Estado. Os meus camaradas que em condições difíceis, nos hospitais civis, trabalham para defender e dignificar o serviço nacional de saúde, grande bandeira e grande conquista da democracia portuguesa. Permitam-me, enfim, que saúde os meus camaradas socialistas que com outros milhares de trabalhadores se manifestam, resistem e protestam contra o novo Código do Trabalho, que representa, como disse Jorge Leita, um retrocesso civlizacional.
É para eles que vai neste momento o meu pensamento e a minha fidelidade de militante socialista.

Um grande português chamado Antero de Quental falou do socialismo como protesto moral contra a injustiça e a exploração. Foi há muito. Mas continua a ser uma boa inspiração para todos nós. Os explorados, os oprimidos, os deserdados da vida foram e são a razão de ser da esquerda. É por eles que estamos aqui, não pelas grandes fortunas, desculpem-me a insistência, do Banco Privado Português.


Amigos, Companheiros e Camaradas:

Eu acho que foi muito bom estarmos aqui a debater. Este debate constitui uma mudança de significado político e cultural.
Há muita gente insatisfeita. Eu também quero mais.

E agora, perguntarão?

Agora há que encontrar o caminho.
E esse caminho somos todos nós. São todas as cidadãs e cidadãos que querem outra política e outra alternativa. Por uma democracia, mais limpa, mais justa e mais solidária.