M!CporCoimbra

2008/12/13

Os Encontros das Esquerdas

Segunda-feira, Dezembro 08, 2008, Elísio Estanque, www.boasociedade.blogspot.com

Em busca de novos caminhos


Perante um PS disciplinado e alinhado com o governo, mesmo com um PSD incapaz de se apresentar como alternativa credível ao PS, a desejada maioria absoluta de Sócrates está longe de ser uma garantia. Parte do tradicional eleitorado do PS está descontente e não votará muito provavelmente no partido. Mas, certamente que, com Manuela Ferreira Leite, muitos votos do PSD irão deslocar-se para o PS. Resta saber qual o peso e qual o resultado final dessas oscilações. A esquerda, de fora e até de dentro do PS, anda hesitante, embora alguma pareça triunfalista com a contestação de rua e com as sondagens. PCP e Bloco parecem poder consolidar posições, com o segundo a ameaçar ultrapassar o primeiro. O PC de Jerónimo mantém-se fiel ao seu discurso e à sua ortodoxia, mas não deixa de se mostrar algo agitado com tais cenários.

Os encontros agendados para a próxima semana em Lisboa, o primeiro no dia 14, que surge por iniciativa da Corrente de Opinião Socialista, ligada a Manuel Alegre, o segundo no dia 15, o Debate das Esquerdas, promovido por independentes e por figuras ligadas às várias esquerdas (incluindo o PC), têm vindo a gerar expectativas e interrogações por parte de diversos quadrantes. Apesar de algum atrito que também já ocorreu, devido a informação da imprensa em que ambas as iniciativas eram misturadas, creio que faz sentido, apesar de tudo – até por ser apoiante e signatário de qualquer destas iniciativas – estabelecer alguma ligação entre si.

Vamos por partes. Do encontro dos “alegristas” com os bloquistas, e onde também participa M. Carvalho da Silva (Fórum Democracia e Serviços Públicos – 14 Dez., Aula Magna, 11,00h), pode resultar, na sequência dos discursos aí programados, que obviamente se adivinham bastante críticos do governo Sócrates, algum sinal de aproximação ou de eventual convergência entre descontentes do PS, dirigentes do BE e outros activistas de esquerda. Divergência e convergência são inseparáveis para criar debate, mas no cenário actual, é expectável uma maior sintonia entre estas sensibilidades, pelo menos no que respeita às críticas à política do governo PS nas áreas em discussão (economia, educação, trabalho, cidades e saúde). Mais duvidosa será uma eventual convergência quanto à criação de uma imaginada frente eleitoral ou de um qualquer programa político alternativo. Mas, a manterem-se estes canais de diálogo, e caso o PS venha a perder a maioria absoluta (e precise dos deputados do BE para governar), será mais fácil isso acontecer com M. Alegre no PS do que fora dele. Ele pode continuar a ser uma importante força de pressão dentro do partido, uma voz de peso da esquerda socialista (capaz de pressionar o governo pelo menos em algumas áreas) e nesse caso assumir-se como elemento mediador entre o BE e o PS. Mas importa ainda saber da estratégia, da prática e do discurso do BE até aos próximos actos eleitorais...

Do encontro do dia 15 – com Florival Lança, Jorge Sampaio, António José Seguro e Ricardo Pais Mamede, com moderação de Ulisses Garrido; sobre o tema «Crise – oportunidade de viragem», dia 15 Dez., Hotel Zurique, 21,00h – pode esperar-se alguma clarificação de posições de personalidades importantes da área do PS, havendo no entanto algum risco de nos ficarmos por discursos demasiado amplos e generalistas, de duvidoso impacto na vida política do país. Importa realmente ouvir as vozes de esquerda. Será importante que cada um contribua com a sua experiência para abrir possíveis caminhos de futuro, sem receio de quebrar fidelidades. Sendo um espaço para Debate e virado para estimular o confronto de ideias, espera-se que haja total abertura e humildade por parte de todos para, em conjunto, questionarem velhas e novas cartilhas, na busca da renovação da esquerda e da revitalização da democracia.

Perante um PS vazio de debate interno e um PC que é mais do mesmo, é fundamental criar espaços como estes, onde se possam colocar as ideias livremente e sem tabus, e buscar possíveis caminhos alternativos para a esquerda portuguesa. Mesmo sem qualquer pretensão de encontrar soluções mágicas, menos ainda chegar a certezas absolutas; e por outro lado, sem saber o que as diferentes esquerdas (incluindo Manuel Alegre, renovadores comunistas, e o BE) irão fazer no futuro, registe-se que estas iniciativas, ao obrigarem quer os dirigentes do PS quer os lideres de outras esquerdas a moverem-se ou a assumirem posição, é já um sinal de que vale a pena os cidadãos livres tomarem a iniciativa nas suas próprias mãos. O contributo pode ser pequeno. Mas é muito maior do que o que fazem tantos oráculos da desgraça e tantos críticos da crítica da crítica...