Da Inibição à Participação - Resposta de Elísio Estanque a Catarina Misarela Rodrigues
Da Inibição à Participação
Num comentário de Catarina Misarela Rodrigues no nosso blogue, que se transcreve aqui, questionava-se acerca da participação pública e dos limites da democracia. Concordo em absoluto com ela quando diz que, mais do que a participação no MIC, importa motivar as pessoas para o envolvimento no debate publico. É de facto aí que reside a génese do revigoramento da democracia. É portanto através do exercício da cidadania activa, da democracia participativa, que poderemos reforçar e dar um novo ânimo à vida publica em geral. É por essa via que se pode "reinventar" a própria democracia representativa.
Para isso também é necessário denunciar alguns dos nossos políticos, quer pela fraca capacidade profissional e técnica, quer pela insensibilidade social, senão mesmo a aversão ao envolvimento activo dos cidadãos na política. Os tiques aparelhistas de muitos políticos reflectem, no fundo, essa espécie de "doença” portuguesa que se assume na inveja, na maledicência e nos comportamentos “tutelares" de quem se recusa a partilhar – os saberes, a responsabilidade, o protagonismo, a autoridade – com os outros que, sejam líderes ou subordinados, têm inteligência e podem contribuir positivamente para que os resultados do trabalho organizativo sejam melhores. A sua ficaria seguramente maior, para que todos possam ganhar com isso.
Há entre nós uma lógica de cariz feudal, em que cada um prefere ficar no seu cantinho e beneficiar com isso, nem que seja a expensas dos outros. Há uma enorme descrença e desconfiança em relação ao desconhecido. Um medo do amanhã. Uma insegurança angustiante. Uma espécie de dor colectiva, pessimista e alienada da realidade. Uma atracção ou desejo descontrolado de fuga para o vazio, que leva as pessoas a inebriarem-se e a esquecerem-se do seu próprio eu.
Este é o estado de espírito português na actual conjuntura. É preciso reinventar o Sujeito activo. O sujeito colectivo que queremos construir começar por ser o sujeito individual que sabe que, para existir, tem de saber viver e partilhar a existência com os outros. Falta-nos, pois, espaço para a comunidade, para a partilha, para a exigência e para a ousadia de podermos inquietar-nos colectivamente.
Por outro lado, é preciso não só convencer as pessoas dos limites da democracia, mas sobretudo da natureza frágil da democracia. Ou os cidadãos despertam para esse problema e são levados a acreditar que podem influenciar o destino das instituições, das colectividades e do país, ou o espaço da demagogia e a margem de manobra dos medíocres, dos oportunistas e dos populistas vai ganhando terreno até que o próprio sistema democrático deixe apodrecer todos os seus
alicerces. Há, com efeito, uma questão moral, um problema de valores, uma indefinição e apagamento das ideologias: questões e problemas que precisam de ser enfrentados e discutidos abertamente.
Elísio Estanque (Executivo da Comissão Coordenadora do MIC/Coimbra)
Comentário [editado] de Catarina Misarela Rodrigues a um post de 20/06
Tony Kushner, em "Dispair is a lie we tell ourselves" (2004), disse que, mais perigoso que a colisão da terra com uma supernova, é viver num mundo onde uma cambada de malfeitores governa e a maior parte das pessoas não tem acesso ao poder, ou tem acesso ao poder mas não sabe ou se esqueceu de que o pode usar e de como é importante usá-lo.
No discurso de Manuel Alegre, gostava de ver comentada a importância da participação das pessoas neste movimento cívico e, mais importante ainda, na vida política (se é que há outra). A "crise" da democracia passa pela questão da falsa imagem que o capitalismo vende de que somos eternamente livres, incluindo livres de não participar nas decisões do Estado; passa pela ideia errada de que a política é complicada e inacessível; pela ideia de que os políticos têm que entreter; pela ideia de que moral e política são universos separados.
Enfim, desculpem o desabafo e, já agora, a falta de acentos [corrigida], mas moro na Holanda e tenho pena de não poder estar aí.
As pessoas precisam de ouvir falar das grandes questões morais e políticas do Estado e precisam de ouvir falar, não de crise da democracia, mas dos seus limites. É preciso convencer as pessoas de que o direito a participar na vida política não é opcional, mas moralmente obrigatório. Precisam de ser lembradas de que têm mais poder do que julgam ter.
1 comentários:
Muito obrigada pela resposta ao meu comenta'rio. O meu nome é Catarina e nao Cristina!!
Nada de grave, no entanto... e mais uma vez obrigado.
Alguèm pode corrigir o erro?
By Anónimo, às segunda-feira, junho 26, 2006 9:40:00 da tarde
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