O 25 de Abril que celebramos
Manuel Alegre, 24-04-2009, www.micportugal.org
A revolução do 25 de Abril que celebramos é a revolução democrática, a revolução dos três “dês” do Programa do MFA: democratizar, descolonizar, desenvolver. Nessa perspectiva histórica, a revolução do 25 de Abril não é uma revolução perdida, é uma revolução vitoriosa.
Revolução original: os militares derrubaram um regime e não guardaram o poder para si, devolveram-no às instituições democráticas sufragadas pelo voto popular. É tempo de reconhecer que se trata de um caso único na História, algo de que todos nós, portugueses, devemos ter orgulho.
Revolução pioneira: o 25 de Abril mostrou que era possível passar de uma ditadura para a democracia sem cair numa nova ditadura. Foi a primeira vez que numa situação revolucionária tal aconteceu. E por isso o 25 de Abril português tem uma dimensão internacional, abrindo caminho à transição democrática na Espanha, na Grécia, no Brasil e noutros países da América Latina.
Como disse na altura Salgado Zenha, “o 25 de Abril foi o primeiro de um conjunto de factos que iniciou no mundo uma nova era.” Mais tarde o americano Samuel Huntington escreveria que a revolução portuguesa tinha inaugurado a terceira vaga democrática.
Não sejamos, pois, mesquinhos em relação a nós próprios. Não desvalorizemos uma revolução que, além de nos restituir a liberdade de expressão, mudou a História de Portugal, ajudou a mudar a História da Europa, de África e da América Latina e ainda hoje é estudada pelos países que chegaram recentemente à democracia.
E não deixemos que sejam esquecidas três dimensões fundamentais do 25 de Abril: a dimensão ética, a descentralização e a dimensão da paz.
A dimensão ética, a aspiração à justiça social, foi inscrita por todos os partidos, da esquerda à direita, nos seus programas iniciais. Os direitos sociais, o direito à saúde, à habitação, ao ensino, à cultura, à segurança social, ao trabalho, estão consagrados na nossa Constituição. Pode haver diferentes concepções sobre a forma de os concretizar, mas não se pode esvaziar o seu conteúdo, sob pena de enfraquecer os direitos políticos e a própria democracia.
Realizar a justiça social, consolidar o espírito de serviço público, reforçar os direitos sociais continua a ser um imperativo do 25 de Abril. Não podemos permitir que a vitória dos três “dês” seja ensombrada por outros “dês”, desemprego, desigualdade e desânimo.
A descentralização, através das autonomias regionais e do poder autárquico democrático, é uma das grandes transformações operadas pelo 25 de Abril, renovando a tradição portuguesa das liberdades locais, que um grande açoreano chamado Antero de Quental considerava como um elemento estruturante da liberdade portuguesa no seu todo.
Finalmente a dimensão da paz. O 25 de Abril fez-se contra a guerra. Trouxe a paz a Portugal e reintegrou o nosso país nas instâncias da comunidade internacional. Com o 25 de Abril, Portugal, não sendo embora uma potência económica nem militar, ganhou prestígio político e moral, como país de paz e liberdade, com um papel de ponte entre a Europa, a África e a América Latina.
O 25 de Abril é um daqueles raros dias na vida de um povo em que o futuro está em aberto, indeterminado. Há um passado que se rejeita, mas o percurso a seguir não está definido à partida. É essa abertura inicial que faz com que todos os sonhos sejam possíveis. E é por esses sonhos que devemos continuar a lutar.
Manuel Alegre