M!CporCoimbra

2008/05/30

2008/05/29

Alegre e Bloco juntos para desafiar Sócrates

A VISÃO desta semana conta-lhe como Manuel Alegre e outros históricos do PS estão a preparar aquilo a que chamam de «diálogo novo» com o Bloco de Esquerda, independentes e renovadores comunistas

Paulo Pena - 28 Mai 2008


Manuel Alegre e vários outros históricos socialistas estão, há um mês, em contacto com dirigentes do Bloco de Esquerda e vários independentes e renovadores comunistas. Este «diálogo novo» resulta, na próxima terça-feira, 3 de Junho, numa festa/comício, no Teatro da Trindade, em Lisboa, que foi convocado em nome dos «valores de Abril», mas que não deixará de servir para lançar fortes críticas ao Governo de José Sócrates. Serão oradores, além de Manuel Alegre, o deputado bloquista José Soeiro e a professora universitária, e antiga colaboradora da ex-primeira-ministra Maria de Lourdes Pintasilgo, Isabel Allegro de Magalhães. A parte musical estará a cargo, entre outros, dos Rádio Macau.

«Pode ser que isto não fique por aqui», adianta Manuel Alegre, em entrevista exclusiva à VISÃO que amanhã, quinta-feira, estará nas bancas. Nesta edição poderá ler, também, como tudo foi preparado, e que expectativas têm os organizadores desta acção inédita que pode trazer agitar as águas na esquerda portuguesa. Poderá também ler, na íntegra, o apelo Agora Aqui escrito pelo deputado socialista e consultar o nome de alguns dos 85 subscritores do documento, entre os quais o reitor da Universidade de Lisboa, António Nóvoa, ou os históricos dirigentes socialistas Edmundo Pedro e José Neves, além do ex-líder parlamentar do PCP, Carlos Brito, e militares de Abril, como o General Alfredo Assunção.

Excerto da entrevista a Manuel Alegre:

Quando diz que «é tempo de buscar os diálogos abertos e o sentido da responsabilidade democrática» não está a apelar a uma refundação da esquerda?

Há muita desesperança no País. Há pessoas que têm afinidades e estão há muito tempo separadas. Nós queremos juntar esquerda à esquerda. Mas não quero criar ilusões: não se trata de uma refundação.

Não se trata, então, do embrião de uma alternativa?

Encontrar uma saída programática seria bom, mas é muito difícil.

Excerto do apelo Agora Aqui:

«(…) Trinta e quatro anos volvidos, apesar do muito que Portugal mudou, o ambiente não é propriamente de festa. Novas e gritantes desigualdades, cerca de dois milhões de portugueses em risco de pobreza, aumento do desemprego e da precariedade, deficiência em serviços públicos essenciais, como na saúde e na educação. Os rendimentos dos 20% que têm mais são sete vezes superiores aos dos 20% que têm menos. (…)»

2008/05/24

Dilemas

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Cipriano Justo, no Público de hoje

Além do ensino da filosofia, os anos da Argélia de Pierre Bourdieu (1955-60) foram dedicados ao estudo da sociedade argelina num contexto de guerra de libertação nacional (1954-62). Mais do que em qualquer outra colónia ultramarina, o conflito argelino foi porventura o que ficou melhor estudado e documentado - quem não se lembra desse ícone do cinema engagé La Bataille d"Alger, de Gillo Pontecorvo (1966) -, devendo-se a Bourdieu, num exemplo de como se realiza investigação participada, a aplicação do método científico na análise dos efeitos provocados por aquele processo revolucionário não só na organização social dos camponeses da Kabília como é vulgar pensar-se, mas dos argelinos em geral (Interventions, 1961-2001). À distância de quase cinquenta anos mantém-se actual uma das sínteses daqueles trabalhos de investigação: no decurso dos processos de transformação emergem dos acontecimentos lógicas internas que, por serem do domínio do simbólico, acabam por se tornar representantes das mudanças operadas. O que acaba por uniformizar e contextualizar as representações sociais, dando-lhes sentido e significado, é essa espécie de totemismo gerado nas rupturas com a situação anterior.

Portugal esteve longe de viver um processo revolucionário semelhante ao argelino. Os pontos de contacto residiram na ruptura: no caso argelino com o seu passado colonial, no caso português com a ditadura. Em Portugal, os valores gerados na oposição ao fascismo e no decurso da revolução só acabaram por se tornar de facto minoritários a partir de 1987, quando a direita obteve a sua primeira maioria absoluta. Durante 13 anos, tantos quantos durou o processo revolucionário e o período de transição, a luta de classes dominou o palco da vida política ditando a duração dos governos e as oscilações dos seus programas. Os 13 anos que se seguiram caracterizaram-se pela progressiva assimilação dos valores do mercado e pelo desenvolvimento do seu habitus. A partir de 2002, com Durão Barroso, a lógica neoliberal passou a dominar a vida dos portugueses, detendo o actual Governo o exclusivo da representação ideológica e programática do PSD, que o digam Marques Mendes, Luís Filipe Menezes e a senhora ou o senhor que se seguirem. Quem ainda ignora que há muito deixou de ser necessário juntar os trapinhos para se viver em união de facto?

Derrotar esta lógica deveria ser o único ponto da agenda política da esquerda no próximo ciclo eleitoral. Qual o papel reservado aos socialistas nesta caminhada até 2009? Naturalmente que isso há-de dizer-lhes respeito, mas este Governo sinalizou de tal forma o rumo da sua política que qualquer assomo de inflexão à esquerda se transformou num sentido proibido. Produziu, também ele, a sua lógica interna: retirou o socialismo da gaveta e foi dependurá-lo no museu de arte antiga, autorizando que se pergunte se este Governo é uma alteridade do PS ou a sua identidade.

Ao invés do dilema do prisioneiro, o compromisso com este estado de coisas só favorece o vencedor e na vida política o vencedor é aquele que de momento detém o poder. Estaremos a meio de um ciclo ou na perspectiva de uma mudança de ciclo? Para quem equaciona uma alternativa, outras hipóteses, não estando isentas de virtuais potencialidades noutro cenário, apresentam-se na actual conjuntura como uma vitória da actual maioria, que faria dela um troféu partidário e um argumento eleitoral na disputa com os destroços do PSD. Mas também é verdade que o que há para fazer e o que deve ser feito não são a mesma coisa, nem sempre coincidem e não é igual para todos. Talvez tenha sido por isso que os economistas inventaram o conceito de aversão ao risco e os psicólogos fizeram dele a principal explicação da conduta humana em situações de incerteza.

Dirigente da Renovação Comunista e membro do MIC

2008/05/22

Portugal é o país da UE com mais desigualdades na distribuição de rendimentos

22.05.2008 - 16h45 Lusa

Portugal foi hoje apontado em Bruxelas como o Estado-membro com maior disparidade na repartição dos rendimentos, ultrapassando mesmo os Estados Unidos nos indicadores de desigualdades. O Relatório Sobre a Situação na União Europeia (UE) em 2007 conclui, no entanto, que os rendimentos se repartem mais uniformemente nos Estados-membros do que nos Estados Unidos, à excepção de Portugal.
O relatório é o principal instrumento que a Comissão Europeia utiliza para acompanhar as evoluções sociais nos diferentes países europeus. Os indicadores de distribuição dos rendimentos mostram que os países mais igualitários na distribuição dos rendimenros são os nórdicos, nomeadamente a Suécia e Dinamarca.
"Portugal distingue-se como sendo o país onde a repartição é mais desigual", salienta o documento que revela não haver qualquer correlação entre a igualdade de rendimentos e o nível de resultados económicos.
Contudo, se forem comparados os coeficientes de igualdade de rendimentos dos Estados-membros com o respectivo PIB ( Produto Interno Bruto) por habitante constata-se que os países com um PIB mais elevado são, na sua generalidade, mais igualitários.

2008/05/11

Ana, 52 anos, um exemplo do empobrecimento da classe média baixa

(no PÚBLICO de hoje)
Ana Maria Rendeiro hesita perante a pergunta. "Se me considero pobre?". E, depois de uma pausa para reflectir, responde. "Sou pobre, embora não seja pobre de rua." Com 52 anos de uma vida moldada pelas deslocações diárias à Fosforeira Portuguesa, em Espinho, onde trabalhou durante 31 anos, viu-se desempregada há ano e meio. Para piorar o cenário, o marido foi vítima de dois enfartes que há um ano o trazem de baixa médica. Mais: o senhorio decidiu fazer obras em casa que implicam uma subida na renda dos actuais 45 euros para perto de 200.
"O fundo de desemprego vai acabar e a médica diz que o meu marido não pode voltar a trabalhar por causa do stress, mas o Estado continua a recusar-lhe a reforma por invalidez. Não sou pessoa de baixar os braços, mas está a ser muito difícil...", desespera, numa preocupação acentuada pelo aumento de custo de vida. "Os 587 euros de subsídio de desemprego mais os 257 euros de baixa médica do meu marido não chegam para as despesas. Não tenho vícios e a roupa é a mesma com que andava há seis anos. Agora, até quando vou tomar banho, penso na água que gasto", conta. Pior seria se tivesse filhos: "Aí estaria como alguns casais que conheço que já vão buscar o almoço ao banco alimentar", antecipa.
Para evitar esse cenário, Ana Maria manda currículos. E, quando não está a responder a anúncios ou a telefonar, está a oferecer-se para fazer limpezas. "É difícil ouvir tantos "nãos" na cara". E o pior é saber-se sem carta de condução e sem carro nem dinheiro para os conseguir. E achar que o diploma do 9.º ano de escolaridade que está prestes a conseguir de pouco ajudará. O pior é quando lhe respondem que é velha para o lugar. "De um lado dizem-me que sou velha para trabalhar. Do outro, que sou nova para a reforma. O que é que querem que eu faça da minha vida?".

2008/05/10

Os jovens e a política


Elísio Estanque, no blog www.boasociedade.blogspot.com

Perante tantos alertas acerca do desinteresse dos jovens pela política, conviria antes de mais lembrar que o fenómeno não é de hoje. Já no tempo em que Cavaco Silva era Primeiro Ministro as actuais tendências se faziam sentir. E nessa altura o actual Presidente não se mostrou particularmente sensível às manifestações de jovens contra as suas políticas, nomeadamente na área da educação.

Porém a chamada de atenção é importante. Esperemos que ela tenha eco junto dos seus destinatários (que, diga-se, não são apenas os jovens). Mas, antes de mais, importa perceber o porquê do desinteresse dos jovens pela vida pública. A meu ver, há três factores principais que estão na base deste acentuar da indiferença e do alheamento perante a política: as políticas neoliberais que acentuam o individualismo; a má imagem da política e dos partidos; o desemprego e a precariedade no trabalho.

1. O primeiro deriva das mudanças sociais e económicas mais gerais que, nas democracias ocidentais, têm conduzido a um aumento do individualismo, do consumismo e da desfiliação, devido às pressões do mercado, aspectos largamente acentuados pela globalização neoliberal. A isso soma-se a perda de importância da família na educação, a falência das politicas educativas nos seus diferentes níveis (básico, secundário e superior), sobretudo naquilo em que o sistema de ensino poderia contribuir para a consciência democrática das novas gerações. A história recente da nossa democracia está completamente alheada da actual juventude. A falta de atenção dada pela escola à formação cívica e política dos jovens é uma das razões para a crescente indiferença. No entanto, o individualismo, a concorrência, o salve-se quem puder deriva, naturalmente, da força do mercado e dos seus instrumentos, sobretudo as indústrias do marketing, da publicidade e da moda que, com os poderosos meios audiovisuais que têm ao seu dispor, modelam as orientações e subjectividades juvenis.

2. O segundo prende-se com o funcionamento dos partidos políticos e a sua crescente perversão aparelhistica e burocrática (ver neste blogue o post sobre Robert Michels e a lei férrea da oligarquia). O discurso repetitivo, as promessas não cumpridas, a defesa obsessiva do pequeno poder, as alianças promíscuas a recusa do debate público aberto, etc, só contribuem para cavar o divórcio entre os jovens e a política. E essa atitude dos partidos reflecte-se nas instituições públicas (em geral por eles dominadas), na sua falta de transparência (desde logo no plano local) e na forma burocrática como os utentes e cidadãos são tratados. Para além disso, os partidos vêm cultivando o carreirismo e o seguidismo ao mesmo tempo que esquecem e abandonam (ou pelo menos remetem para segundo plano) o debate ideológico e a discussão política. E as estruturas das juventudes partidárias parecem limitar-se a reproduzir, senão mesmo a acentuar, essa mesma lógica tecnoburocrática. O mesmo se passa no associativismo estudantil. O calculismo, a estratégia pessoal ou a ilusão de aceder uma carreira na política é o que mais importa na actividade do jovem e promissor quadro partidário. Percebendo isto, a massa da população juvenil (nomeadamente nas universidades) não vê nenhum estímulo em participar nas actividades cívicas e associativas (recordo apenas que nas ultimas eleições para a AAC houve uma abstenção de cerca de 75%; e noutras universidades será porventura ainda maior).

3. Finalmente, a questão laboral e da precariedade no emprego é outro motivo para a indiferença da juventude perante a política e o associativismo. Os sindicatos, embora gritem contra a precariedade, não se mostram capazes de atrair os jovens para as suas estruturas. Porquê? Há um discurso, igualmente gasto e repetitivo, que não consegue desligar-se do velho modelo, da permanente auto-vitimização ou do auto-elogio, julgando-se ainda no centro da transformação histórica (embora já sem vanguarda) ao mesmo tempo que na prática privilegia a defesa corporativista dos sectores estáveis do emprego. As experiências e movimentos associativos de outra natureza tendem a ser ostracizados pelos sindicatos. Tudo isto é agravado pelo facto de serem os jovens as maiores vitimas do desemprego, dos recibos verdes, dos contratos a termo, numa palavra, da precariedade no trabalho. Os que já trabalham e estão nestas condições têm poucas possibilidades de intervir no movimento sindical (até porque são dissuadidos de o fazer pelos empregadores). À indiferença junta-se também o medo. Os que estão à procura do primeiro emprego ou a terminar os seus cursos estão dispostos a tudo para agarrar a primeira oportunidade laboral. O tempo de sobra é para o lazer, a diversão e o consumo (mais ou menos alienantes). Compete ao poder político dar o exemplo, protegendo os que querem intervir nos sindicatos. Compete aos dirigentes associativos mudar de atitude e mostrá-lo na prática. Compete às instituições de ensino e a todos nós investir mais na construção de uma cultura democrática para a juventude do século XXI.